Não existe condenação para aqueles que vivem em Cristo Jesus

Hermenegildo Manuel Bernardo

Eu cresci como uma criança temente a Deus. Desde pequeno frequentei a religião católica, indo todos os domingos à igreja com os meus primos, mas nunca cheguei a ser batizado.

Nela, desde pequeno, eu aprendi que Deus castiga quem faz coisas más. Quando minha mãe deixou a igreja católica, nós como filhos, também paramos de frequentá-la e foi aí que no ano de 2004 comecei a estudar a bíblia com as Testemunhas de Jeová. Eu não estudava regularmente porque achava meio aborrecido e para uma criança de 10 anos isso pouco importava, mas a regularidade da minha instrutora me colocava na obrigação de aceitar estudar sempre.

Em 2005 comecei a estudar regularmente, mas sentia medo de ir à reunião porque a minha mãe não suportava a ideia de sermos Testemunhas de Jeová. Com a influência do meio envolvente, eu acabei frequentando as reuniões com regularidade e depois a minha mãe acostumou-se com a ideia. No ano de 2006 no dia 16/10/2006 acabei por me tornar publicador não-batizado da congregação. Tinha apenas 12 anos de idade mas eu era muito admirado por muitos no território, porque era muito pequeno na altura.

Lembro-me de certa vez que eu estava no ministério com um irmão de nome Alberto Cassua ele me dizer que eu era um exemplo para muita gente, porque comecei a pregar com a idade de Cristo. Na verdade, eu só conhecia as Testemunhas de Jeová como a religião verdadeira. Vejam que eu nem tinha a noção que existe um Corpo Governante.

Resumindo, eu simplesmente me tornei publicador por causa dos amigos e porque ia viver no paraíso se eu me tornasse Testemunha de Jeová, e que se não fosse seria destruído no Armagedom! Este era o lema da minha vida enquanto publicador.

No ano de 2007 eu fui desqualificado e deixei de ser publicador não-batizado porque havia tirado algo a um irmão e ele acabou contando aos anciãos sem falar antes comigo, e na verdade, eu havia devolvido o artigo dele. Para minha alegria ele foi desassociado no ano seguinte por um outro motivo. Enquanto desqualificado, eu vivia com o medo do Armagedom, porque acreditava que se a destruição me encontrasse assim, eu seria destruído. Fiz muitos esforços para voltar mas não conseguia, eu nem aceitava em frequentar outras religiões porque acreditava por A+B que as Testemunhas de Jeová era a única religião verdadeira.

Voltei a frequentar as reuniões regularmente e no dia 30/12/2012 acabei sendo readmitido como publicador não-batizado da congregação, eu era muito zeloso no ministério de campo e no dia 3/11/2013 fui batizado como Testemunha de Jeová. Logo após o batismo, assinei no mesmo ano uma petição para pioneiro auxiliar durante 3 meses. Na altura estava com 19 anos e a terminar o ensino médio. As pessoas admiravam o meu zelo e recebi o apelido de 'dono do território' por causa da minha frequência no ministério de campo.

No mesmo ano fui aprovado como Pioneiro Regular. Eu nem me preocupava com as outras coisas pois a minha rotina era só ministério e curso, porque eu sonhava em ser Superintendente de Circuito. Por isso, rejeitei a faculdade em troca de cursos técnicos. Eu era muito elogiado e as pessoas gostavam de me ver a fazer designações na congregação.

Havia recebido o privilégio de trabalhar na área da literatura da congregação onde existia muita disputa entre os jovens na congregação, tanto é que eu dizia que o único erro na nossa organização era existir designações, porque isso gerava inveja, raiva e ciúmes por parte dos que não as tinham.

No mês de agosto do ano de 2014, meu tio havia conseguido uma bolsa de estudo para eu ir estudar em Cuba, de modo a entrar na polícia marinha de angola. Eu rejeitei de imediato. Meu pai ameaçou-me expulsar de casa, mas eu não me importei porque achava que aquilo era uma tentação do Diabo. Um primo meu acabou ficando com a mesma bolsa e até o momento ele está na Cuba.

Naquele mesmo dia meu pai me disse o seguinte:

"Você não vai permanecer nesta religião a vida toda, tudo isso é só fantasia."


Depois desta suposta tentação recebi uma designação para o congresso regional, achando que era uma benção de Jeová. No ano de 2015 meu pai insistiu que eu tinha que fazer faculdade , com medo da sua reação eu cedi ao pedido dele mesmo sendo contra a minha vontade. Eu me empenhava em ambos os lados e me saía muito bem, preparando sempre as reuniões e cobrindo designações de muitos irmãos. Os anciãos me admiravam muito, pois apesar de estar na faculdade, eu era equilibrado.

Certa vez um ancião me disse:

"Eu desejo ser pioneiro regular, e a pessoa que vai-me ajudar como se manter na carreira apesar de algumas ocupações és tu, porque tu tens um equilíbrio divino." 


Como estudante universitário eu aprendi a questionar e a analisar todas as coisas. Na verdade, a doutrina do sangue nunca foi muito aceite pela minha pessoa enquanto Testemunha de Jeová, mas o pico final veio quando eu estava a fazer o segundo ano da faculdade, em uma cadeira que atualmente eu a chamo a 'cadeira da descoberta': Gestão Estratégica.

Como estudante de Gestão Empresarial, eu aprendi nesta cadeira que existem dois tipos de organização: organizações centralizadas e organizações descentralizadas. As organizações centralizadas são organizações que tudo depende do topo da sua hierarquia, e organizações deste tipo escondem muitas coisas dos seus associados e as TJ são uma organização centralizada. Foi aí que decidi pesquisar mas sobre a organização que eu fazia parte.

Tive muitas decepções e quando fazia perguntas sobre o que eu pesquisava, sempre me diziam: "o escravo já explicou este assunto" ou "ainda não chegou o tempo para entendermos isto". Eu sentia que o escravo falava mas alto que a própria Bíblia, e às vezes me indicavam Sentinelas para tirar as minhas dúvidas, e eu não me sentia a vontade com esta situação toda. Parecia que as Sentinelas tinham mais valor que a Bíblia.

Foi nessa altura que li o livro "Crise de Consciência", escrito por um ex-membro do Corpo Governante, Raymond Franz e muitos outros. Conversei com muitas ex-Testemunhas de Jeová tais como o Ezequiel Afonso, Anderson Gonçalves, Carlos Fernandes, Leonel Correia Elizeu Apolinário e lia com regularidade os artigos publicados na página DESPERTA e tudo fazia sentido para as minhas pesquisas. Eu me sentia traumatizado, não conseguia conter o meu desapontamento e falava sobre as coisas que eu e mais amigos pesquisávamos.

Por esta razão acabamos por sermos repreendidos, eu e mais 2 irmãos da congregação. Depois da minha repreensão, eu parei de assistir às reuniões regularmente e comecei a encarar os membros de outras religiões de uma maneira diferente: todos somos irmãos porque Cristo morreu pela humanidade, não por um único povo aqui na terra.

Comecei a frequentar outras religiões ainda como Testemunha de Jeová. No mês de Maio mesmo antes da minha saída definitiva, enquanto lia a Bíblia, eu me deparei com o livro de Romanos 8:1 que diz:

"Não existe condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus."


Este texto mudou a minha forma de pensar e me fez ver que nós devemos viver para Cristo e se assim fizermos, estaremos unidos com ele e ninguém vai-nos condenar por isso.

Daí eu escrevi as minhas razões do porquê de eu estar saindo das Testemunhas de Jeová, mencionando a data errada de 1914 e outras falsas profecias, a doutrina mortífera do sangue, os casos encobertos de pedofilia, sobre o número dos 144.000, a desassociação mal aplicada e muitas outras doutrinas erradas. Eu deixei esta religião com uma sensação amarga, porque eu rejeitei excelentes oportunidades pensando que estava fazendo a vontade de Deus.

Mas hoje sou feliz, porque faço parte de uma família cristã e decidi abraçar Cristo como meu único meio de salvação e meu mediador perante Deus. Eu descrevo a minha trajectória nesta religião como uma falta de tempo, um atraso na vida e eu desejo que todas as Testemunhas de Jeová se libertem destas correntes que se chamam "Corpo Governante". Que aprendam a pesquisar e que deixem de achar que as Sentinelas são uma explicação da Bíblia. Que percebam que Jesus Cristo morreu pela humanidade, não somente para as Testemunhas de Jeová e que todo aquele que recebe e aceita Jesus Cristo na sua vida, é um Cristão.

As pessoas perguntam se nunca voltaria a ser membro desta religião, e a minha resposta é sempre a mesma:

"Nenhum ex-prisioneiro desejaria voltar na prisão novamente."

Hermenegildo Manuel Bernardo

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