Este artigo não pretende ser um estudo exaustivo sobre o assunto da interpretação da doutrina do sangue, conforme interpretado pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Recorrendo a várias fontes, pretende abordar de forma clara e inequívoca um dos assuntos mais polémicos e que mais revolta tem criado na sociedade em relação às Testemunhas de Jeová. Em virtude da sua firme recusa em aceitar transfusões de sangue, elas têm sido consideradas fundamentalistas na sua análise dos textos bíblicos. Muitas capas de jornais e serviços noticiosos televisivos ao longo dos anos têm apresentado o resultado desta recusa, relatando a morte de homens, mulheres e até mesmo crianças que podendo ser salvas pelo uso de uma transfusão*, não o são. Visto que em muitos casos, apenas uma transfusão pode salvar alguém de uma morte prematura, pode-se por isso perguntar: Quantas Testemunhas de Jeová já morreram devido à afirmação da Sociedade, de que é errado alguém aceitar uma transfusão de sangue? É indiscutível que a política da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados de proibir o uso do sangue, resultou desde a sua implementação, na morte de inúmeras Testemunhas que recusaram sangue, quando o sangue era a única opção médica à sua disposição para sustentar a vida. O artigo do Consumer Reports de Setembro de 1999, afirmou que as transfusões de sangue salvam cerca de 10.000 vidas por dia. Com esse tipo de estatísticas, pode apenas especular-se quantas Testemunhas de Jeová perderam a vida devido a este assunto (mais à frente será apresentada uma estatística). Para entendermos melhor como chegamos a ter as transfusões de sangue, nada melhor que conhecer a sua história. O texto que se segue é da Dra. Carolina Melo e Costa, interna de Imunoterapira no Hospital Dr. Prof. Fernando da Fonseca em Portugal. Este excerto faz parte do seu artigo "Breve História da Transfusão. Transfusão de Concentrado Eritrocitário no doente cardíaco". –––––––––––––– "Breve História da Transfusão Sanguínea A transfusão sanguínea é uma das práticas médicas mais antigas do mundo. “A história da transfusão sanguínea faz parte da fábrica da história da humanidade: abrange religião, e superstição, bem como ciência tendo sobrevivido ao longo dos tempos desde os “humores circulatórios” à medicina moderna.” De facto poucas outras substâncias provocam as mesmas emoções, tem as mesmas associações e/ou conduzem aos mesmos medos que o sangue. O Homem desde cedo tomou conhecimento que o líquido avermelhado que corria do seu corpo era essencial à vida. Ao longo dos anos o sangue foi sendo considerado como uma força que “dá vida” com ligação aos Deuses e à fé religiosa. Nei Ching (cerca do ano 1000 AC) refere que o sangue contém a alma; os índios pré-colombianos norte americanos feriam o seu corpo para “extrair o “seu poder”; os egípcios banhavam-se em sangue para recuperar forças; os romanos bebiam sangue dos gladiadores mortos para curar a epilepsia e para a “restauração espiritual”. Rituais de sangue persistiram até épocas históricas bem próximas de nós. Em Portugal, vestígios já posteriores ao nascimento de Cristo ainda existem como o Santuário de Panóias – Vila Real, construído entre os finais do século II e inícios do século III dc. A transfusão é nos nossos dias uma arma terapêutica muito usada e determinante na mortalidade e morbilidade dos doentes. Nos Estados Unidos estima-se que um em cada três americanos irá precisar da transfusão de um componente sanguíneo ao longo da sua vida. A referência mais antiga conhecida que regista uma passagem que poderá representar uma transfusão, está num manuscrito hebreu que refere: “Naam, chefe dos exércitos de Bem Adad, rei da Síria, doente com lepra, consultou médicos que...retiraram o sangue das suas veias e lhe administraram outro”. Durante a idade média devido ao carácter profundamente religioso e cheio de medos, existiu uma estagnação cientifica e só no inicio do renascimento, no século XV, ano de 1492 volta a haver referências ao sangue e à possibilidade de poder ser usado como cura dos “males humanos”. Segundo relatos, em 1492 o papa Inocêncio VIII “agonizante por insuficiência renal crónica, recorre a um místico que promete curá-lo com sangue de três crianças de 10 anos, a quem é pago um ducado”. Embora a forma como a administração foi feita não seja esclarecedora nem quais as consequências, serve este relato como prova que a mente humana nunca deixou de ver este precioso líquido como uma possível arma terapêutica. Na primeira metade do século VII com a descoberta, por William Harvey, da circulação sanguínea, levantaram-se consideráveis especulações sobre a possibilidade da transfusão de sangue, bem como a infusão de medicamentos e provocou o aparecimento de várias propostas:
Richard Lower, em 1665, registou a primeira transfusão sanguínea com sucesso: o médico manteve cães vivos com a transfusão de sangue de outros cães. Começou por tentar ligar a veia jugular de dois cães, mas o sangue rapidamente coagulou nos tubos. Em face destes resultados canulou a artéria cervical de um cão ligando-a à veia jugular de outro, exsanguinando o animal dador. Lower repetiu esta demonstração na Royal Society e foi documentado nas Philosophical Transactin em Dezembro de 1666. Com esta experiência, fica claro que Lower foi o primeiro a definir a transfusão sanguínea como importante para curar hemorragias graves. Os primeiros registos de tentativa de tratar o sofrimento e a doença, em humanos, através da transfusão sanguínea datam de 1667 quando Jean-Baptiste Denis publicou no “Philosophical Transactions” a sua experiência ao transfundir, com sucesso um rapaz de 15 anos com uma doença febril de origem desconhecida, com sangue de carneiro. Repetiu a experiência ao transfundir um homem agitado de 34 anos, com sangue de carneiro. Nesta época acreditava-se que o sangue de carneiro tinha qualidades calmantes/relaxantes. Consequentemente nesta altura regista-se também a primeira reacção transfusional hemolítica: Denis relatou que no dia seguinte à transfusão, o doente manifestou hematúria, acabando por falecer. Por esta razão as transfusões foram consideradas como acto criminoso acabando o parlamento francês, a Royal Society de Londres e o Papa por proibirem a transfusão. Em 1818, James Blunt, obstreta, foi o primeiro a transfundir sangue humano com sucesso quando transfundiu uma doente com hemorragia pós-parto, com sangue do próprio marido. Blunt reconheceu que estava a substituir o volume sanguíneo perdido e não a dar uma “força vital”. É aqui que a medicina transfusional tem o seu impulso para a evolução e avanço até à era moderna. Seguiram-se várias experiências, algumas bem sucedidas e outras não. Em 1849, Routh faz uma revisão de todas as transfusões até à data e calcula a taxa de mortalidade, concluindo que tinha havido “taxas de mortalidade bastantes inferiores às de uma hérnia ou iguais às de uma amputação”. Estes resultados mantêm a porta aberta da transfusão sanguínea e encorajam os médicos a novas experiência e à descoberta de utensílios como o de Blundell – Um deles consistia num instrumento em que o sangue era colhido num vaso de metal, envolvido em água quente e depois injectado numa veia do doente com a ajuda de uma seringa acoplada. Inventou também um tubo para transfusão directa cuja aplicação foi um relativo sucesso. Entretanto na Sociedade Médica Inglesa e na sua congénere francesa a discussão continua acesa entre os adeptos e os opositores da transfusão, resultando num acordo: a transfusão era admitida só em situações excepcionais como: “ hemorragia grave, fraqueza extrema por dispepsia ou estenose do esófago, colapso (choque por febre), diarreia grave ou disenteria”. Actualmente, apenas a hemorragia grave tem indicação para a transfusão. Nos Estados Unidos, a transfusão praticou-se provavelmente desde 1830 embora apenas haja provas da sua prática em 1860-1861 (New Orleans) e registos de 4 transfusões durante a guerra civil. Uma das dificuldades mencionadas por Blundell foi a coagulação do sangue, encorajando a transfusão directa ligando a artéria do dador à veia do doente. Em 1835 Bischoff propõe o sangue desfibrinado, sugerindo uma variedade de técnicas, a maioria das quais incorporando alguma forma de agitação. O primeiro a propor um anticoagulante é Neudorfer em 1860, recomendando bicarbonato de sódio. Foi depois proposto o fosfato de sódio, sem qualquer resultado. O século XIX termina sem estarem resolvidos os principais entraves que inviabilizavam a transfusão e que teriam que ser resolvidos. Os avanços em diversas áreas permitiram o desenvolvimento da medicina transfusional e banco de sangue modernos. Estes avanços passaram pela descoberta dos grupos sanguíneos e dos derivados sanguíneos, e muito importante, pela capacidade de armazenar componentes sanguíneos. A evolução da medicina transfusional passou ainda pela “descoberta” inevitável dos efeitos adversos da transfusão e por atitudes que evitassem estas reacções. Grupos Sanguíneos Karl Landsteiner, em 1900, publicou a primeira de uma série de publicações demonstrando a presença do sistema ABO, afirmando que “o sangue de um homem saudável aglutina não só com as células vermelhas dos animais, mas também com as células vermelhas de outros humanos”. Embora o uso desta informação para melhorar a segurança transfusional, tenha começado logo nos anos seguintes, só apenas em 1920 o uso da tipagem ABO passou a ser regular. O sistema Rh foi descoberto em 1939-40 por Landsteiner, Weiner, Levine e Stetson, explicando a causa de muitas reacções transfusionais inesperadas. Em 1945, Coombs, Mourant e Race descreveram o uso de um soro com anti-globulina humana para detectar anticorpos IgG nos testes de compatibilidade – Teste de Coombs, não sabendo eles que em 1908 Moreschi já tinha descrito a utilização deste soro. Hoje em dia o teste de Coombs continua a ser utilizado nas práticas laboratoriais de banco de sangue. Armazenamento de componentes sanguíneos Uma das dificuldades da transfusão, já mencionadas, a coagulação do sangue, encorajou a transfusão directa. A transfusão directa (anastomose da artéria do dador à veia do receptor) foi realizada em 1908 por Alexis Carrel (fig1) e a transfusão directa utilizando uma via de três lúmens foi utilizada na 2ª Guerra Mundial. O deflagrar da 1ª Guerra Mundial (1914 – 1918), veio acelerar o desenvolvimento de processos práticos de transfusão em auxílio às vítimas da guerra. Em 1914 Rous e Turner, utilizavam o Citrato de sódio como anticoagulante, em pequena quantidade, misturado com glucose para armazenar pequenos depósitos de sangue antes de uma batalha. Estes depósitos podiam ser armazenados por apenas alguns dias. Em 1917, Oswad Robertson, médico americano ligado ao exército inglês realiza as primeiras transfusões com sangue armazenado, durante a Batalha de Cambrai. A 2ª Guerra Mundial (1938-1945) veio impulsionar a procura de melhores soluções transfusionais. Loutit e Mollinson, em 1943, desenvolveram a solução ACD (acid citrate dextrose), permitindo o armazenamento do sangue por semanas, facilitando assim a criação de bancos de sangue. É importante referir que a acidificação da solução com anticoagulante permitiu a esterilização e a redução da contaminação bacteriana das unidades armazenadas. A disponibilidade das soluções de conservação concomitantemente com o desenvolvimento de equipamentos eléctricos permitiu a organização de programas para a preservação de sangue O primeiro banco de sangue referenciado como tal é o criado em Londres em 1930, e em 1951 é criada a primeira rede transfusional, nos estados Unidos. Derivados sanguíneos Em 1940, Edwin Cohn desenvolveu um processo de fraccionamento a frio (congelação pelo etanol) que permitiu isolar os constituintes do plasma: albumina, gamma-globulina e fibrinogénio, entre outros – Fraccionamento de Cohn. Este processo permitiu o uso da albumina como expansor de volume e a utilização da fracção com fibrinogénio (que contem factor VIII) para tratar a hemofilia A. O fibrinogénio como terapêutica caiu em desuso devido ao risco de hepatite B e o tratamento da hemofilia A limitou-se à administração de plasma fresco congelado. Quando em 1961, Paul e Shannon demonstraram que o precipitado formado quando o plasma era descongelado no frio (crioprecipitado) continha factor VIII, ocorreu uma revolução no tratamento da hemofilia A. Em 1985, factor VIII e IX liofilizados ficaram disponíveis e em 1993 através da engenharia genética começou a ser produzido factor VIII recombinante. O facto IX recombinante só mais tarde estaria disponível – 1998. Actualmente graças à engenharia genética os produtos plasmáticos são desprovidos de componentes humanos, incluindo o facto VIIa. Terapêutica e componentes sanguíneos Walter e Murphy, em 1950, introduziram os sacos de plástico (de PVC) em substituição das garrafas de vidro, para a colheita e armazenamento do sangue. Isto permitiu o desenvolvimento da terapêutica por componente sanguíneo. Começaram a ser utilizadas centrífugas refrigeradas para separar os componentes sanguíneos por densidade. Nesta altura foram criados também uns sacos satélites, associados ao saco de colheita principal, para posterior armazenamento dos componentes sanguíneos separados. O concentrado de plaquetas, separado do sangue total colhido revelou-se muito útil no tratamento da trombocitopénia em 1961. Em 1972 as plaquetas começaram a ser colhidas por aférese. Em 1967 foi introduzido no mercado um concentrado de globulina Rh que revelou ser eficaz na diminuição ou quase eliminação da doença hemolítica do recém-nascido a Rh. Aférese Em 1950, Cohn desenhou uma centrifuga para separar os componentes celulares do plasma. Como resultado do trabalho de diversos campos e áreas existiu um avanço na instrumentalização da aférese, permitindo que este processo ficasse cada vez mais disponível. O desenvolvimento da colheita por aférese permitiu a colheita de plaquetas e granulócitos de um único dador e a colheita de volumes suficientes de plasma para a produção de concentrados de factor, albumina, imunoglobulina e outros derivados. A automatização da aférese expandiu e simplificou o uso desta modalidade de colheita, que é vital para o tratamento de várias doenças, como a PTT, e a drepanocitose. Em 2000 iniciou-se a colheita por aférese de eritrócitos, podendo hoje em dia colher-se todos os componentes por este processo. Efeitos adversos da transfusão Em 1960 os bancos de sangue constataram uma associação forte entre os dadores pagos e o elevado número de casos de transmissão da hepatite. Devido a este facto em 1970 iniciou-se uma transacção lenta e difícil para a dádiva de sangue benévola. Em 1971 introduziu-se o uso do teste para o antigénio de superfície da Hepatite B, que reduziu a transmissão de hepatite devido a transfusões sanguíneas. Na década de 80, em 1985, e apenas dois anos após o primeiro caso descrito de transmissão de HIV por transfusão, foi introduzido um teste laboratorial para a detecção do antigénio do HIV. Nos anos 90 testes para a detecção do VHC tornaram-se rotineiros. Em 2000 a maioria dos centros de colheita de sangue, nos países desenvolvidos, adoptaram testes laboratoriais para a detecção de ácidos nucleicos virais, reduzindo assim o risco de transmissão por transfusão de HIV e HCV para menos que 1:1000000 unidades testadas. Desde esta altura tem vindo a crescer o reconhecimento da transmissibilidade de agentes infecciosos como o CMV, o Parvovírus B19, HTLV, vírus West Nile e do Trypanosoma Cruzi e os priões, o que tem permitido o crescimento também de várias abordagens para proteger a segurança do fornecimento de sangue. Em alguns casos novos testes tem sido implementados, noutros os componentes tem sido tratados para minimizar o risco de infecção de um dado agente usando a redução patogénica ou tecnologias de inactivação. Em determinadas situações os dadores com risco de transmitirem uma determinada doença são suspensos da dádiva na triagem. Nos últimos 50 anos as complicações não infecciosas da transfusão também se tornaram evidentes: reacções transfusionais não hemolíticas (RTNH) e a doença contra hospedeiro associada à transfusão (DCHAT). Em 1962 Greenwalt e colegas demonstraram que a leucorredução através de filtros diminuía as reacções febris. A generalização da leucorredução iniciou-se nos anos 80 e tornou-se num processo pré armazenamento em todos os bancos de sangue nos anos 90. Nesta altura a leucorredução é associada também a uma diminuição das infecções por CMV e HTLV. Em 1970 Graw e colegas usaram a irradiação para prevenirem a DCHAT. Actualmente Os campos da medicina transfusional e do banco de sangue continuam a desenvolver-se à medida que novos agentes infecciosos emergem e também porque há um maior reconhecimento dos riscos não infecciosos da transfusão. O aumento do risco associado à transfusão em certos grupos populacionais, como os doentes críticos, os insuficientes cardíacos, e aqueles submetidos a cirurgia cardíaca, trouxe um novo desejo de perceber melhor os benefícios e efeitos adversos da transfusão sanguínea e da “storage lesion” do sangue. Existe um objectivo contínuo que é melhorar a terapia transfusional. A segurança do doente expandiu no meio intra hospitalar, onde a identificação do doente e a terapêutica apropriada é crítica. Novas tecnologias para evitar a incompatibilidade ABO emergiram. A somar a este facto os eritrócitos estão a ser manipulados geneticamente em ambiente experimental com o objectivo de retirar os antigénios A e B de forma a criar um produto universal. Contudo estes produtos ainda não foram aprovados para utilização humana, pois nos ensaios clínicos demonstraram uma elevada mortalidade. A transfusão sanguínea é um elemento crítico para o tratamento médico e cirúrgico e por esse motivo certamente, esta área continuará a evoluir no intuito de uma maior segurança e rendimento transfusional." –––––––––––––– O que a Torre de Vigia tem ensinado sobre o uso do sangue A organização religiosa conhecida como Sociedade Torre de Vigia, ensina e impõe como doutrina às Testemunhas de Jeová, que uma transfusão de sangue é o mesmo que comer sangue, comparando-a a alimentação intravenosa. Aliás, durante várias anos a Organização ensinou que uma transfusão era, de facto, uma forma de alimentar o corpo, conforme se pode notar nas seguintes afirmações de suas publicações: Acerca da segunda citação, é interessante ler o artigo "Academic Deception or Incompetence?" de Marvin Shilmer, onde a declaração de Georges W. Crile sobre as palavras de um médico francês são analisadas. Ficarão surpreendidos com a desonestidade da Organização no uso destas declarações. Ver aqui: http://marvinshilmer.blogspot.pt/2013/02/academic-deception-or-incompetence.html De acordo com esta visão, claramente em contradição com os factos reconhecidos mundialmente pela comunidade científica, a Torre de Vigia proíbe as transfusões de sangue aos seus seguidores. Basta colocar uma pessoa sem comer, apenas dando-lhe transfusões de sangue e ficará claro que tal pessoa acabará por morrer de inanição. O que é mais interessante e que tem passado despercebido às Testemunhas de Jeová, é que a própria Organização já assumiu publicamente que uma transfusão de sangue equivale a um transplante de órgão: "Por conseguinte, quer nutram objeções religiosas às transfusões de sangue quer não, muitas pessoas talvez rejeitem o sangue simplesmente por se tratar, em essência, de um transplante de órgão que, no máximo, só é parcialmente compatível com seu próprio sangue." (As Testemunhas de Jeová e a Questão do Sangue. pág. 42 par. 111) "Quem recebe sangue de outra pessoa corre basicamente os mesmos riscos dos que recebem um transplante de órgão." (Despertai, Junho de 2006) "O sangue é um órgão do corpo, e transfusão de sangue não é nada menos que um transplante de órgão." (Despertai, 22 de Agosto de 1999) Assim como alguém que recebe um órgão humano (ou animal) para substituir um órgão do seu corpo que se encontra danificado ou funciona mal, não está praticando canibalismo ou alimentando-se de tal órgão, do mesmo modo, uma pessoa que recebe sangue não se está alimentando desse "tecido" ou órgão líquido: "Sim, o sangue é um tecido, assim como o coração e os rins são tecidos." (Despertai, 8 de Janeiro de 1973) Têm realmente liberdade de escolha? Têm sido proferidas declarações por parte de representantes das Testemunhas de Jeová, onde são negadas quaisquer penalizações por parte da liderança para com aqueles que decidem aceitar uma transfusão de sangue total ou dos componentes proibidos pela Organização. É dito ao público que as Testemunhas de Jeová têm total liberdade de escolha com respeito aos tratamentos médicos a adotar, incluindo o uso do sangue. Mas será isto verdade? Não! Uma Testemunha de Jeová que aceite uma transfusão de sangue total ou dos 4 componentes primários (segundo o conceito atual), estará a violar uma "lei sagrada", talvez a lei mais sagrada aos olhos das Testemunhas de Jeová. A punição, dessa pessoa, caso seja considerada culpada e não demonstre arrependimento, será o ostracismo. A pessoa será considerada "dissociada", entendendo-se pelas suas acções que ela não mais deseja ser uma Testemunha de Jeová. Após isso, o indivíduo passará a ser evitado pela própria família e amigos Testemunhas de Jeová, que serão pressionados e até mesmo admoestados a não ter contacto com o "pecador". Nem mesmo um cumprimento poderá ser-lhe dirigido ao passar por ele na rua. Devido à doutrinação extremista e claramente dogmática sobre este assunto, as Testemunhas de Jeová levam a sério o entendimento da Organização sobre a questão do sangue. Elas tornam-se assim muito radicais neste assunto, preferindo morrer ou deixar morrer um ente querido, a aceitar uma transfusão para repor o sangue perdido em uma operação ou acidente. E fazem o mesmo com respeito a seus filhos menores. A maioria das Testemunhas carrega uma declaração consigo, afirmando a sua recusa em receber sangue e instruindo o pessoal médico de emergência a não administrar uma transfusão de sangue total ou dos 4 componentes primários do sangue (segundo o entendimento da organização), caso a Testemunha de Jeová estiver inconsciente. Esta declaração é um documento legal, assinado pela Testemunha de Jeová e um seu representante que garantiu defender a sua posição caso ela não o possa fazer (ex. estando inconsciente). As Testemunhas de Jeová reconhecem que a sua religião é a única que se posiciona contra a transfusão de sangue, embora não lhes ocorra que este fato é, em si mesmo, a demonstração que a sua doutrina não se baseia realmente na Bíblia, mas num entendimento divergente e singular. Nem mesmo os judeus, a quem a Lei Mosaica foi dada e aqueles que tinham como obrigação guardar-se do uso do sangue como alimento, aceitam esta interpretação conforme veremos de seguida. O que as Testemunhas de Jeová deveriam aprender do conceito rabínico Pikuach Nefesh O conceito rabínico judaico pikuach nefesh, é um conceito milenar que defende o valor ou santidade da vida humana acima de qualquer tradição ou doutrina religiosa. Segundo este conceito, uma vida deve ser preservada a todo o custo, sendo por isso a obrigação de um judeu salvar a sua vida ou a de outrem, mesmo que para isso tenha que violar uma lei ou mandamento religioso. Por exemplo, se existe alguém em perigo de vida, aplicar o pikuach nefesh, significa por exemplo, violar o Sábado para que essa vida seja salva, talvez viajando de carro nesse dia para levar a vítima ou doente ao hospital. Significa também, por exemplo, um judeu comer comida que não seja kosher, caso a sua saúde ou vida dependa disso. É importante perceber que para os judeus, a Lei Mosaica continua a ter um papel importante em suas vidas. Isso inclui a forma como esta proíbe o consume de carne com seu sangue. Por isso, os judeus ortodoxos molham a carne em água, salgam-na e então a drenam, a fim de tirar todo o sangue. Neste aspeto são muito mais rigorosos que as Testemunhas de Jeová e têm um regime alimentar cuidado e seleto (kosher). É pertinente perceber que mesmo continuando a seguir os mandamentos da Lei mosaica com respeito ao sangue, os judeus estão autorizados a receber transfusões de sangue. Não existem por isso, grupos religiosos judaicos que proíbam transfusões de sangue. Assim, reservar a vida prevalece sobre a Lei mosaica: um princípio conhecido como pikuach nefesh. Do mesmo modo, os muçulmanos estão também proibidos de beber ou comer sangue e derivados (haram), mas são-lhes permitidas as transfusões como um procedimento para salvar suas vidas. Como é óbvio, o uso do sangue quando uma pessoa corre risco de vida seria pikuach nefesh, ou seja, colocar a vida da pessoa acima de uma lei ou mandamento religioso. Embora, os judeus não encarem o uso do sangue na medicina do mesmo modo que as Testemunhas de Jeová, ainda assim, caso vidas estivessem em jogo, percebe-se claramente qual a decisão que tomariam à luz deste conceito bíblico. E que dizer de Jesus? Será que ele ensinou algo que concorde com este conceito rabínico? Note as próprias palavras da Organização, ao referir-se ao discernimento de Jesus em lidar com situações, em que a razoabilidade era posta em causa. Reflicta na atitude de Jesus e pense como seria, caso fosse uma pessoa em perigo de vida e necessitasse de uma transfusão de sangue. É interessante notar como na análise desta passagem, a Organização das Testemunhas de Jeová aceita de bom grado e até elogia a razoabilidade de Jesus perante a violação da Lei cometida por esta mulher, em virtude do seu esforço em preservar a sua saúde, até mesmo a sua vida. Eles até mesmo destacam isso dizendo: "Ela era impura do ponto de vista da Lei; então, não podia tocar em ninguém. (Lev. 15:25-27)" Repare que neste caso, não existia nem mesmo uma situação de perigo de vida eminente, mas sim uma condição física debilitante que poderia vir no futuro a conduzir a uma morte prematura. Mesmo assim, o que Jesus fez? Considerou que a vida ou saúde daquela mulher estava acima do cumprimento da Lei. Aqui está aplicado o princípio do pikuach nefesh. Teria Jesus agido diferente caso fosse nos dias de hoje e tivesse em seu poder salvar uma vida pelo uso de uma transfusão de sangue, mesmo que isso hipoteticamente pudesse violar a Lei de Deus? Pense nisso! Mas existem outras passagens que revelam como Jesus SEMPRE considerava a vida humana acima de qualquer lei ou doutrina. Veja mais estes exemplos: "Ele lhes disse: “Se um de vocês tiver uma ovelha, e essa ovelha cair num buraco no sábado, será que não vai agarrá-la e tirá-la dali? Quanto mais vale um homem do que uma ovelha! Por isso, é permitido fazer algo bom no sábado.”" – Mateus 12:11, 12 "A seguir, ele lhes perguntou: “É permitido, no sábado, fazer o bem ou fazer o mal, salvar uma vida ou matar?” Mas eles continuaram calados. Depois de olhar para os que estavam à sua volta, com indignação e profundamente triste com a insensibilidade do coração deles, ele disse ao homem: “Estenda a mão.” Ele a estendeu, e a mão foi restabelecida." – Marcos 3:4, 5 "Naquela ocasião, Jesus passou pelos campos de cereais no sábado. Seus discípulos ficaram com fome e começaram a arrancar espigas e a comer. Vendo isso, os fariseus lhe disseram: “Veja! Seus discípulos estão fazendo o que não é permitido fazer no sábado.” Ele lhes disse: “Vocês não leram o que Davi fez quando ele e seus homens ficaram com fome? Como ele entrou na casa de Deus, e eles comeram os pães da apresentação, algo que não era permitido comer, nem a ele nem aos que estavam com ele, mas apenas aos sacerdotes?" – Mateus 12:1-4 Estas passagens mostram como Jesus usou este princípio rabínico, chamado de pikuach nefesh, colocando a vida humana acima de qualquer outra coisa, mesmo que violasse um mandamento da Lei mosaica. Parafaseando as palavras de Jesus em Marcos 2:27, poderíamos concluir o seguinte: "A Lei veio à existência por causa do homem, e não o homem por causa da Lei". Assim, nenhum humano deveria perder a sua vida em virtude de uma Lei divina que foi criada para sustentar a vida e mostrar respeito por ela. A história de uma doutrina sempre em evolução Para entendermos melhor como as Testemunhas de Jeová chegaram ao entendimento atual em relação ao uso do sangue, é importante fazermos uma viagem no tempo. Recorrendo a uma timeline criada pela AJWRB (Defensores da Reforma das Testemunhas de Jeová sobre o Sangue), poderemos acompanhar desde o princípio, a evolução desta doutrina, desde o início do movimento religioso conhecido como Estudantes da Bíblia, passando pelas mudanças doutrinais após a eleição déspota e ilegal de J. F. Rutherford como presidente da Watchtower, resultando num novo movimento religioso conhecido como Testemunhas de Jeová (ver uma análise desse tema aqui), e observar como o entendimento e doutrina foram mudando com respeito ao tema bíblico do significado e uso do sangue na religião das Testemunhas de Jeová. Cronologia da Doutrina do Sangue na Sociedade Torre de Vigia • Os eventos notáveis na história da política de sangue da Sociedade Torre de Vigia 15 de janeiro de 1892 Primeira menção da Sociedade Torre de Vigia sobre uma "visão bíblica do sangue" O entendimento do fundador CT Russell era que a ordem em Atos 15 foi uma medida temporária para promover a unidade durante a transição da era judaica para a Era da Igreja. 15 de novembro de 1892 Charles Taze Russel afirma que a lei dietética sobre o sangue era obrigatória aos cristãos Para isso menciona o que Tiago escreveu como objetivo, a saber, evitar ser pedra de tropeço para os irmãos judeus. 15 de abril de 1909 Charles Taze Russel comenta sobre Atos cap. 15 Ele indica a sua crença de que observar a proibição "NÃO OS TORNAVA CRISTÃOS", mas servia para preservar a união de Judeus e Gentios Cristãos. 1919 Clayton Woodworth torna-se editor da revista Idade de Ouro Woodworth usa a revista como instrumento da sua desconfiança em relação à classe médica e como modo de divulgar as suas opiniões pessoais sobre ciência e medicina – incluindo a desaprovação da vacinação. Abril 1922 A oposição da Torre de Vigia à vacinação tem início Um artigo intitulado "A Fraude da Vacinação" aparece na Idade de Ouro. 29 de julho de 1925 A Torre de Vigia elogia um homem que doava sangue regularmente A Idade de Ouro apresenta um artigo apoiando tal acção. 15 de dezembro de 1927 A Torre de Vigia sugere que a "proibição do sangue" em Génesis 9:4 aplica-se a todos os homens "No entanto, desde que apenas a 'lei dietética' estava sendo considerada, esta não era uma questão controversa." 4 de fevereiro de 1931 A Torre de Vigia proíbe oficialmente as vacinas, mas não as transfusões de sangue "As vacinações são uma violação da Eterna Aliança que Deus fez com Noé... Todas as mentes razoáveis devem concluir que não foi o comer o sangue que Deus objetou, mas foi trazer o sangue de besta em contacto com o sangue do homem." 25 de dezembro de 1940 "Médico Heróico" doa sangue A Torre de Vigia publica uma reportagem elogiando um "médico heróico" que doou um quarto do seu próprio sangue durante uma emergência. Julho de 1945 A Torre de Vigia oficialmente proíbe as transfusões de sangue e derivados como "pagãos e desonrosos para Deus". Julho de 1949 O artigo da Torre de Vigia "Peças de reposição para o seu corpo", descreve transplantes de órgãos como inquestionáveis "maravilhas da cirurgia moderna". 15 de dezembro de 1952 A Torre de Vigia reverte a proibição acerca das vacinas Numa carta de 15 de Abril de 1952, vacinações, como a varíola, são agora oficialmente permitidas. Muitas Testemunhas já as vinham levando por uma dúzia de anos ou mais, com a Sociedade tendo conhecimento de que a vacinação contra a varíola não continha sangue, tendo sido avisada por uma testemunha chamada William Cetnar. É certamente razoável especular que a proibição não foi oficialmente suspensa até 1952 por respeito a Clayton J. Woodworth, que tão ferozmente se opôs às vacinas. 8 de janeiro de 1954 A Torre de Vigia proíbe soros sanguíneos (frações) É-nos dito que são precisos vários litros de sangue total para obter o suficiente da proteína do sangue ou "fração" conhecida como gamaglobulina para uma injecção... ser feita a partir de sangue total coloca-a na mesma categoria que as transfusões de sangue com respeito à proibição de Jeová de colocar sangue no corpo. Agosto de 1958 A Torre de Vigia declara que aceitar transfusão de sangue não é uma ofensa com direito a desassociação Uma pergunta na secção "Pergunta dos Leitores" explica que deve-se permitir que uma irmã ungida participe dos emblemas no memorial, embora ela tendo recebido uma transfusão de sangue, raciocinando que ela simplesmente é "imatura". 15 de setembro de 1958 A Torre de Vigia aprova o uso de soros sanguíneos como decisão pessoal Soros sanguíneos (frações) são permitidas. Regras importantes declaram que o uso de soros sanguíneos, tais como difeteria antitoxina e gamaglobulina podem ser usados como matéria de decisão pessoal. 15 de outubro de 1959 A Torre de Vigia específica que nem mesmo o próprio sangue pode ser armazenado O sangue deve ser inutilizado, e desse modo, seria errado alguém retirar o seu próprio sangue, guardá-lo e voltar a colocá-lo de novo. 15 de janeiro de 1961 A Torre de Vigia permite a doação/transplante de orgãos como assunto de consciência A Torre de Vigia recua na posição de que os transplantes de orgãos são uma forma de "canibalismo" e permite a doação/transplante de orgãos como assunto de consciência. 15 de janeiro de 1961 A Torre de Vigia afirma que traços da personalidade são transmitidos pelo sangue A Torre de Vigia faz a notável declaração de que traços da personalidade, incluindo impulsos tais como o desejo de assassinar ou suicídio são transmitidos pelo sangue. 15 de janeiro de 1961 Desassociação aplicada ao uso de sangue ou produtos proibidos Aceitar sangue ou produtos derivados é tornado passível de punição pela desassociação. 15 de fevereiro de 1963 A Torre de Vigia volta atrás na aprovação de soros sanguíneos Soros sanguíneos são novamente proibidos, revertendo a regra da Sentinela de 1958. Qualquer fração de sangue é agora considerada nutriente e proibida. Esta regra, contudo, não se aplica a vacinas que se mantêm uma questão de consciência. 15 de novembro de 1964 A Torre de Vigia volta atrás novamente na questão da aprovação dos soros sanguíneos Apenas 21 meses após a última mudança, a Torre de Vigia volta a alterar a sua posição, aprovando os soros sanguíneos! Esta é a 4ª mudança completa em apenas setes anos. Segundo o entendimento da Organização, médicos Testemunhas podem, contudo, administrar transfusões de sangue em pacientes não-Testemunhas. Julho de 1966 A Torre de Vigia refere-se à transfusão de sangue como "canibalismo" A Torre de Vigia descreve a transfusão de sangue como uma forma de "canibalismo". 15 de novembro de 1967 A Torre de Vigia reverte sua posição, proibindo transplantes de orgãos como sendo "canibalismo" Numa reversão total de posição, a Torre de Vigia determina que os transplantes de orgãos são também "canibalismo". Doação de orgãos é agora fortemente desencorajada. Março de 1971 A Torre de Vigia afirma que o coração está ligado ao cérebro e cria emoções A Torre de Vigia faz a afirmação espantosa de que o coração não é apenas uma bomba, mas está ligada ao cérebro através dos nervos e é, de facto, o órgão real onde afeições, motivações, desejos e emoções são literalmente formados. Junho de 1974 A Torre de Vigia reverte a sua posição (novamente) sobre os soros sanguíneos Outra mudança completa sobre soros sanguíneos: estes são novamente assunto que deve ser deixado à consciência individual, embora o artigo aparentemente o desencoraje. 22 de fevereiro de 1975 A Torre de Vigia determina contra tratar a hemofilia com factores plasma A Torre de Vigia afirma que os verdadeiros cristãos, seguindo o mandamento bíblico de abster de sangue, não usam factores plasma para tratar a hemofilia. 22 de junho de 1975 A Torre de Vigia quietamente reverte a sua posição sobre tratar a hemofilia com factores plasma Apenas quatro meses depois escrever contra o uso de fatores de plasma para o tratamento de hemofilia, a Torre de Vigia reverte a sua posição. O Corpo Governante decide que as frações de sangue para hemofílicos são aceitáveis como uma questão de consciência. Começando no início de 1970, é dito às Testemunhas elas podem aceitar apenas um tratamento. Aqueles que telefonam para a sociedade após 11 de junho é-lhes dito que eles podem tomar uma decisão pessoal quanto a se devem ou não usar os fatores VIII e IX. Esta política não se tornará oficial nos próximos três anos, aparentemente, porque o corpo governante não quer inverter oficialmente a sua posição tão rapidamente. Aqueles que escreveram sobre o uso de fatores VIII e IX são contactados directamente pela sociedade. Aqueles que contactaram por telefone e não podem ser contatados de volta provavelmente morrem. 1977 A Torre de Vigia publica "As Testemunhas de Jeová e a Questão do Sangue" A brochura "Sangue" descreve as transfusões de sangue como transplantes de orgãos e insiste que os pais devem permanecer firmes em recusar transfusões de sangue para seus filhos. 15 de junho de 1978 A Torre de Vigia oficialmente suaviza a sua posição com respeito aos soros sanguíneos A Torre de Vigia afirma que soros sanguíneos não são um método de "sustentar a vida". Hemofílicos aprendem agora oficialmente que eles podem aceitar o tratamento com componentes sanguíneos ou frações. Se tivessem ligado antes à Sociedade, já teriam sabido isso cerca de três anos antes. Se eles não ligaram, então eles provavelmente já estariam mortos. A Torre de Vigia também diz que as Testemunhas podem usar máquinas coração-pulmão, desde que sejam preparadas com fluidos não sanguíneos. 1980 A Torre de Vigia estabelece "Comissões de Ligação Hospitalar" (CLHs) através do país Centenas de Comissões de Ligação Hospitalar são criadas e munidas de instruções e listas de médicos simpatizantes. As comissões irão se esforçar em contactar médicos ou entidades de serviço social que tentam intervir em benefício de menores. 15 de março de 1980 Outra mudança, desta vez sobre transplantes de orgãos Após receber "nova luz", a Torre de Vigia reverte a sua posição, declarando que os transplantes de orgãos não são "canibalismo" e que os anciãos não devem tomar acção judicial contra a Testemunha que receba um. 22 de junho de 1982 A Torre de Vigia faz distinção entre componentes sanguíneos "maiores" e "menores" A Sociedade introduz uma distinção legal fictícia de "maiores" e "menores" componentes do sangue. Produtos "menores" são permitidos enquanto os "maiores" são proibidos. A hemodiluição é listada como objectável. 15 de maio de 1984 A Torre de Vigia relutantemente permite transplantes de medula óssea Transplante de medula óssea é discutida como sendo um assunto de consciência, mas parece desencorajar o seu uso. 15 de junho de 1985 A Torre de Vigia usa a crescente epidemia da SIDA/AIDS para apoiar a sua política do sangue A Torre de Vigia usa a epidemia da SIDA/AIDS como evidência da sabedoria da Sociedade sobre o assunto do sangue. 8 de outubro de 1988 A Torre de Vigia cita a SIDA/AIDS para dar credibilidade à política do sangue A Torre de Vigia afirma que a sua política tem protegido as Testemunhas de Jeová da SIDA/AIDS. Reconhecendo que cerca de 10.000 americanos com hemofilia grave têm sido infectados, eles não mencionam que estes indivíduos foram infectados por causa do tratamento com fatores VIII e IX, que têm estado na lista da Torre de Vigia como aprovados nos últimos dez anos ou mais, e portanto, a posição da sociedade de fato, não ofereceu nenhuma proteção para as Testemunhas hemofílicas. Março de 1989 Algumas transfusões autólogas intraoperativas são permitidas A Sociedade parece abrir a porta a algumas transfusões autólogas intraoperativas. Embora não sejam mencionadas por nome, é implícito que algumas técnicas de limpeza sejam permitidas. Março de 1991 As Testemunhas são encorajadas a ensaiar que respostas elas dirão caso questionadas por um juiz As Testemunhas de Jeová são treinadas quanto a que dizer e encorajadas a ensaiar as respostas que darão, caso sejam questionadas por um juiz. 15 de outubro de 1992 A Torre de Vigia aconselha a não haver preocupações por causa de aditivos sanguíneos na comida A Torre de Vigia diz que não existe necessidade de ficar preocupado acerca de alimentos que contenham sangue, a não ser que exista uma boa razão para suspeitar que contenha. 22 de maio de 1994 Jovens Testemunhas que morreram em resultado da recusa de sangue aparecem na revista Despertai! A Sociedade publica o artigo "Jovens que puseram Deus em primeiro lugar", apresentando as fotos e histórias de jovens Testemunhas que morreram em resultado da proibição do sangue. 8 de dezembro de 1994 Revista Despertai! faz afirmação falsa quanto à posição no passado com respeito ao factor RH Referente ao factor RH, feito de soro sanguíneo, Despertai! afirma que "esta revista e sua companheira têm comentado consistentemente sobre este assunto". Na realidade, a injecção RH foi absolutamente proibida pela Sociedade Torre de Vigia até 1974 e foi, pelo menos até 1978, desencorajada. Agosto de 1995 A Sociedade aprova determinada utilização da hemodiluição normovolêmica aguda pela "Cell Saver" As Testemunhas podem agora ter o seu próprio sangue transfundido de volta para si, no âmbito do processo de hemodiluição normovolêmica aguda (ANH), desde que tal seja realizada utilizando um procedimento de recolha de sangue autólogo ("cell saver") e que envolva apenas um 'breve' armazenamento do sangue fora do o corpo. 1997 A Sociedade Torre de Vigia permite que uma Testemunha de Jeová na Austrália aceite a transfusão de glóbulos brancos A Sociedade Torre de Vigia permite que uma Testemunha de Jeová na Austrália aceite uma nova terapia envolvendo a transfusão de glóbulos brancos, os quais ainda estão listados como produto sanguíneo proibido pela Torre de Vigia. O procedimento é chamado de "enxerto autólogo", que soa mais como um transplante do que transfusão. 15 de fevereiro de 1997 A Torre de Vigia encoraja os anciãos a temperarem a firmeza com a misericórdia ao lidar com pessoas que aceitaram transfusões de sangue Os anciãos são encorajados a ajudar e a providenciarem entendimento àqueles que aceitaram transfusões de sangue. Em casos judicativos irão lembrar-se de que o amor é a espinha dorsal do Cristianismo e deverão temperar firmeza com misericórdia. 23 de fevereiro de 1997 O movimento de reforma começa a organizar-se O membro do Corpo Governante Dan Sydlik falha em responder a uma petição para assistência em reformar o assunto do sangue. Em 23 de fevereiro, o website New Light on Blood (Nova Luz sobre o Sangue), fica online. Junho de 1997 AJWRB é criado Um grupo de oito membros de CLHs e vários outros anciãos Testemunhas de Jeová vinham a comunicar-se regularmente. Em Junho, AJWBR nasce. 1998 O movimento pela reforma do Sangue ganha importância Um apelo final é feito diretamente ao Corpo Governante em Março. As principais revistas médicas começam a chamar a atenção para o movimento de reforma do sangue entre as Testemunhas de Jeová, e a controvérsia ética cresce. Versões em língua estrangeira do New Light on Blood começam a aparecer, incluindo em português. 1999 AJWRB apresenta primeira grande mostra médica A AJWRB exibe a primeira grande mostra médica na conferência American College of Emergency Physicians em Las Vegas, Nevada. 2000 A Sociedade Torre de Vigia substitui a desassociação pela "dissociação" dos transfundidos Na primavera, os superintendentes de circuito nos Estados Unidos recebem uma carta da Sociedade Torre de Vigia. Num esforço de evitar possíveis processos judiciais, a Sociedade instrui superintendentes de circuito para dirigir os corpos locais de anciãos a não desassociar quem aceita transfusões de sangue. Se a sua conduta se tornar conhecida e eles forem considerados impenitentes, serão considerados como tendo "dissociado-se". Fevereiro de 2000 O diagrama da AJWRB ilustra a política da Torre de Vigia ao permitir, em essência, o uso de 100% do sangue Em fevereiro a AJWRB publica um novo diagrama ilustrando a revisada política da Torre de Vigia, que em essência permite 100% do sangue a ser usado na forma fracionada. 15 de junho de 2000 A Torre de Vigia permite todas as frações dos "componentes primários do sangue" Em junho, a Sociedade Torre de Vigia institui grandes reformas na sua política do sangue: "…quando a questão envolve frações de quaisquer componentes primários, cada cristão deve conscienciosamente decidir o que fazer, após cuidadosa meditação com oração." Isto estabelece as bases para os membros aceitarem soluções de hemoglobina que transportam oxigênio. Relatórios rapidamente começam a surgir a partir dos mídia confirmando a nova política sobre a hemoglobina. Em Setembro, torna-se evidente que a STV irá permitir o uso de hemoglobina bovina. Outubro de 2000 A AJWRB expõe na Sociedade Americana de Anestesiologistas A AJWRB expõe em Outubro na convenção da Sociedade Americana de Anestesiologistas em São Francisco. Outubro de 2000 O Journal of Medical Ethics (Jornal de Ética Médica), lança luz sobre a ética médica da Torre de Vigia Em outubro, o Jornal de Ética Médica publica o que equivale a uma derrota esmagadora da posição da Torre de Vigia na comunidade de ética médica. Estes artigos inovadores abrem a porta para uma comunidade médica mais abrangente. 2001 O British Medical Journal (BMJ) publica "Aspetos bioéticos das recentes mudanças na política de recusa do sangue pelas Testemunhas de Jeová" Em janeiro, o British Medical Journal (BMJ) publica o artigo "Aspectos bioéticos das recentes mudanças na política de recusa do sangue pelas Testemunhas de Jeová". O artigo é publicado online e um extenso debate rapidamente surge no sistema de publicação de resposta rápida da BMJ. 15 de junho de 2004 A Torre de Vigia informa as Testemunhas de Jeová que a hemoglobina é permitida A Sentinela de 15 de junho de 2004 expande o artigo de 15 de junho de 2000. Pela primeira vez, a comum Testemunha de Jeová descobre que o maior componente do sangue (hemoglobina) é agora permitida como sendo uma questão de escolha pessoal (infiltrados e membros da AJWRB já sabiam disso há quatro anos. As Testemunhas de Jeová também têm vindo a usar Polyheme e Hemopure onde existem disponíveis em ensaios clínicos). Agosto de 2010 A atual política do sangue é explicada num vídeo Dan Clark, uma ex-Testemunha de Jeová explica o contexto da política do sangue da Torre de Vigia, os "cartões do sangue" trazidos pelas Testemunhas e o entendimento errado do "abster-se de sangue". 10 de janeiro de 2012 Sangue – Quão Resoluto? Marvin Shilmer escreve no seu blogue um artigo que expõe como muitos dentro da comunidade religiosa não estão assim tão determinados a seguir os ditames da liderança em relação à doutrina do sangue. Ver aqui. 12 de janeiro de 2012 A Torre de Vigia produz um vídeo que promove a cirurgia "sem sangue" A Torre de Vigia produz um vídeo usando entrevistas com profissionais da medicina e cientistas para apoiar a cirurgia com limitado ou nenhum uso do sangue. Ao analisar esta timeline uma coisa salta claramente à vista: A doutrina do sangue, conforme entendida pela liderança das Testemunhas de Jeová, jamais seguiu um percurso evolutivo, ao contrário do que as Testemunhas acreditam. Diversos avanços e recuos na forma de encarar o uso do sangue e seus derivados em medicina, fizeram com que aquilo que ontem era permitido usar, hoje já não o fosse e por sua vez no futuro, voltaria a ser possível usar. Percebe-se aqui um claro desnorte da liderança que, usando as páginas da revista A Sentinela como texto sagrado, guiou as Testemunhas de Jeová durante décadas num caminho peregrino pelo deserto e com sérias consequências na vida dos tomaram a peito tais interpretações. Basta pensar nas famílias que perderam seus entes queridos na morte, de modo prematuro, devido à recusa da vacinação, transplantes e uso do sangue e seus derivados. Esta linha histórica do pensamento da Torre de Vigia com respeito ao sangue, demonstra como eles têm demonstrado pouca consideração pela forma como interpretam as Escrituras. Especialmente pouca consideração com respeito às pessoas que são influenciadas e seguem de forma cega tais interpretações. Por exemplo, com respeito ao uso do sangue e derivados, Marvin Shilmer, que tem um blogue dedicado a esse tema desde há alguns anos, chegou à conclusão de que pelo menos cerca de 50.000 pessoas da comunidade religiosa das Testemunhas de Jeová já morreram desde que a proibição do uso do sangue e derivados foi imposta e fortemente penalizada através da desassociação (ver aqui). Adeline Keh, 40, sofreu uma infecção fatal após o parto por cesariana no hospital Homerton no leste de Londres. Ela foi transferida para um hospital em Cambridge, onde ela recusou uma transfusão de sangue e morreu um mês depois do nascimento. http://www.dailymail.co.uk/news/article-2828862/Husband-tells-agony-death-Jehovah-s-Witness-wife-refused-blood-transfusion-C-section.html Lee Elder, Diretor da AJWRB, no seu artigo "Será que a Liderança das Testemunhas de Jeová acredita na sua própria doutrina do Sangue?", avaliou a evolução do pensamento e prática da religião em relação ao sangue e afirmou o seguinte: "Os líderes actuais da Watchtower, seriam desassociados pelos anteriores líderes pela sua posição actual. Sem sombra de dúvida, a liderança das Testemunhas de Jeová experimentou uma profunda mudança na sua crença em relação ao sangue. Indiscutivelmente esta liderança actual não mais acredita na sua razão primária de que o sangue é sagrado e pertence exclusivamente a Deus. Contudo, continua a ensinar e impor a sua doutrina do sangue como se acreditasse." Lee Elder tem toda a razão! A organização das Testemunhas de Jeová tenta fazer crer aos seus membros que estes, ao aceitarem derivados de sangue, estão de facto, a respeitar a premissa da interpretação de Atos 15:28, 29 com respeito a "abster-se de sangue". A realidade é que não estão! Sendo o sangue supostamente sagrado, conforme a interpretação da religião, e tendo ele que ser inutilizado após sair do corpo (Levítico 17:13), então as perguntas lógicas a fazer são:
A história de uma doutrina sempre em evolução Mesmo quando se olha para a forma como a Organização atualmente elabora a sua doutrina e prática com respeito ao uso do sangue, encontramos claras incoerências. Conforme vimos na timeline, começando no final dos anos 40, a organização declarou inicialmente a proibição absoluta de aceitar sangue sob qualquer forma, quer total quer em frações. Então, com o passar dos anos, ela acrescentou novas normas, que entravam cada vez mais nos aspectos técnicos da questão. As mais recentes regras referentes às frações do sangue são as apresentadas na Sentinela de 15 de junho de 2000, págs. 29-31 e 15 de junho de 2004, págs. 14-24, 29-31, e no livro Mantenha-se no Amor de Deus, págs. 215-218. Estas regras abordam uma nova definição do que pode ser permitido em relação aos componentes do sangue. Alega-se então que quatro “componentes primários” – glóbulos vermelhos, glóbulos brancos, plaquetas e plasma – são proibidos, mas as “frações” derivadas de todos os quatro “componentes primários” são permitidas. O quadro que se segue apresenta basicamente a posição atual da organização acerca do uso do sangue: Esta posição, especificando elementos do sangue “Inaceitáveis” (parte superior) e elementos classificados sob “O Cristão Deve Decidir” (parte inferior), é esboçada na revista A Sentinela de 15 de junho de 2004 e no livro Mantenha-se no Amor de Deus. Isto significa que as partes do sangue permitidas em artigos anteriores podem agora ser apresentadas como meras “frações” do plasma. A façanha óbvia é que as partes do sangue anteriormente aprovadas (globulinas, albumina, fator de coagulação VIII, etc.) podem ser reduzidas em importância, em comparação com os glóbulos brancos e vermelhos e as plaquetas. Assim, a inconsistência da posição anterior em fazer uma distinção arbitrária entre os vários componentes do sangue, é agora removida para as Testemunhas que confiam submissamente nesta nova interpretação. A Sociedade tinha dificuldade em lidar com essa inconsistência quando era desafiada. A solução para seu dilema necessariamente tinha de envolver novos componentes, tais como “fragmentos” de glóbulos brancos e vermelhos e plaquetas, mencionados especificamente. Essa tolerância, agora expressa claramente, teria estado fora de cogitação antes. Já que um glóbulo vermelho do sangue refinado na forma de hemoglobina liberada de sua membrana já é usado, até mesmo retirado de gado bovino (ex. PolyHeme, Hemospan e Hemopure), a nova posição da Sociedade tem certamente consequências de longo alcance para as Testemunhas. Leia a notícia onde a vida de uma Testemunha de Jeová foi salva recorrendo a isso (aqui). No artigo "Fake Blood, Real Controversy" (Sangue Falsificado, Verdadeira Controvérsia) de Randy Dotinga, são discutidos produtos feitos de frações de sangue que as Testemunhas de Jeová agora podem transfudir. Note como ela explica o assunto: "PolyHeme e Hemopure da Biopure com sede em Massachusetts - estão em fase final de pesquisa. Hemopure, utilizado em cirurgias, é feito de sangue de bovino, enquanto PolyHeme é derivado da hemoglobina, uma proteína encontrada nas células vermelhas do sangue. Há um outro benefício, também, um que recebeu pouca atenção. Enquanto a igreja Testemunhas de Jeová desencoraja transfusões devido à posição bíblica contra o consumo de sangue, ela deu aos seus 1 milhão de membros americanos, margem de manobra para aceitar produtos que não são derivadas dos principais componentes do sangue." Pense um pouco neste aspeto. Acredita mesmo que ao permitir frações de sangue a partir de gado bovino, a Torre de Vigia está a ser coerente com a tão dogmática posição de que o sangue é sagrado e de que deve ser inutilizado? (Levítico 17:13, 14) O Ministério do Reino de novembro de 2006, trazia consigo um suplemento com o tema "Como encaro as frações de sangue e os procedimentos médicos que envolvem o uso do meu próprio sangue" e apresentou uma tabela que demonstra claramente como agora, mediante o novo entendimento, uma Testemunha de Jeová pode aceitar 100% do sangue, desde que fracionado. Claramente se entende que, segundo o entendimento da liderança, cada "componente primário" do sangue é aceitável quando "fragmentado" nos seus diversos "componentes secundários". A Organização cria assim uma falsa dicotomia entre frações ou componentes primários do sangue e frações secundárias do mesmo, como se ao utilizar-se apenas aquilo que a Organização entende que está de acordo com a vontade de Deus, sendo o restante "inaceitável para o cristão" seja a única postura correta. É interessante que este tipo de linguagem, do que é "aceitável" ou não para um cristão com respeito ao sangue já havia sido usada antes. Mas neste caso em sentido oposto! Por exemplo, veja o comentário da Sentinela de 15 de Março de 1962 (em português), pág. 174, afirmando categoricamente: “É violada a lei de Deus em tais usos medicinais do sangue? É errado suster a vida mediante infusões de sangue, plasma, glóbulos vermelhos, ou várias fracções de sangue? Sim!” A mesma Sentinela menciona na pág. 191, como resposta à Pergunta dos Leitores: “Como se pode saber se a carne comprada num açougue ou num mercado tenha sido sangrada apropriadamente? Também, como se pode saber se os frios, massas ou remédios nas farmácias contenham sangue ou fracções de sangue?” Na resposta, a certa altura a Sociedade aconselha: “Se tiver razão para acreditar que certo produto contenha sangue ou fracção de sangue, pergunte àquele que o vende… uma bula pode dizer que certo produto contém albumina… o único modo de se achar a fonte da albumina no determinado produto é interrogar aqueles que o preparam…se a bula disser que certos tabletes contenham hemoglobina, uma verificação similar revelará que é de sangue; assim, o cristão sabe, sem perguntar que ele deve evitar o preparado.” Assim, é fácil constatar à partida que duas fracções eram proibidas e encaradas como "sangue" para o cristão, em 1961: Hemoglobina e Albumina. São estas fracções hoje permitidas? Basta recorrer à tabela acima e tirar as suas conclusões. Assim, é claro perceber que quem determina a dada altura o que é aceitável ou inaceitável para um "cristão" aceitar, não é a Bíblia ou algum princípio bíblico, mas tão somente a interpretação religiosa das pessoas que estão na altura a determinar tais doutrinas. Lembra-se das palavras acima de Lee Elder? Relembremos: "Os líderes actuais da Watchtower, seriam desassociados pelos anteriores líderes pela sua posição actual." Não são as transfusões de sangue perigosas? Pode-se afirmar que as Testemunhas de Jeová têm sido enganadas e conduzidas de forma errática, fazendo-lhes crer que as transfusões são perigosas e não têm nenhum papel importante em salvar vidas. O início deste texto apresentou um relatório que provava o contrário: cerca de 10.000 vidas são salvas todos os dias pelo uso de transfusões de sangue (Consumer Reports de Setembro de 1999). Embora existam riscos associados às transfusões, a Torre de Vigia tem feito crer que estes riscos são muito mais sérios do que realmente o são na realidade. Um exemplo disso, é por exemplo esta citação da revista Despertai: “As probabilidades de contrair-se AIDS em uma transfusão de sangue são de 1 em 28.000.… E a AIDS não é o único perigo advindo das transfusões de sangue. Longe disso…… A hepatite infecta centenas de milhares e mata muitos mais receptores de transfusão do que a AIDS.…” (Despertai! 22 de Outubro, 1990, págs. 8-9) Apenas 9 anos depois deste artigo alarmante, o relatório Consumer Reports de Setembro de 1999, apontava que essa hipótese havia decrescido significativamente para 1 em 1 milhão para a AIDS (SIDA) e 1 para cem mil para a hepatite C. O relatório Consumer Reports de 1999 foi ao ponto de afirmar que “…a probabilidade de infecção a partir de duas unidades de transfusão de sangue é substancialmente menor do que a chance de ser assassinado ou de morrer num acidente de viação durante um ano". E prosseguiram a explicar que “de facto, para um paciente de hospital, o maior risco demonstrado aqui é o de morrer de uma reacção adversa a algum medicamento.…As transfusões salvam cerca de 10.000 vidas por dia.…” (Consumer Reports, Setembro 1999, págs. 61, 63). Quando artigos da Sentinela afirmam que uma cirurgia pode ser realizada sem sangue, eles desviam a atenção dos leitores do fato de que há circunstâncias em que o sangue é absolutamente necessário para sobreviver. Nestas situações Testemunhas de Jeová deveriam ter a liberdade de escolher o tratamento mais adequado para seus próprios corpos. No artigo Jehovah's Witnesses, Blood Transfusion, and the Tort of Misrepresentation (Testemunhas de Jeová, Transfusão de Sangue e o Delito de Falsas Declarações, escrito pela advogada Kerry Louderback-Wood, apresenta apresenta factos importantes que demonstram que a Torre de Vigia tem sido tudo menos honesta na sua apresentação de informações sobre transfusões de sangue: "O principal recurso da Sociedade quanto à sua política do sangue, "Como Pode o Sangue Salvar a Sua Vida?" (brochura), ensina tanto as Testemunhas como as pessoas interessadas sobre a proibição do sangue da religião. Além de dar a interpretação religiosa da Sociedade, a brochura baseia-se em citações de historiadores, cientistas e profissionais médicos para reforçar a sua posição de recusa do sangue. Este artigo irá discutir em primeiro lugar as deturpações da brochura, ao citar estes escritores seculares e a disponibilidade de processos judiciais privados para pessoas lesadas quando uma organização religiosa deturpa factos seculares." Louderback-Wood fornece exemplos de publicações da Sociedade serem seletivas na informação apresentada aos seus membros no que diz respeito aos perigos de aceitar ou recusar sangue, indo tão longe como citar de forma distorcida, a fim de levar as Testemunhas de Jeová a uma compreensão errada da necessidade do sangue. A seguinte tabela, publicada no artigo escrito por Louderback-Wood, mostra a evolução dos riscos associados às transfusões de sangue com respeito à transmissão da Hepatite B, C e HIV ao longo de 4 décadas: Ao analisar esta tabela oficial da Cruz Vermelha (publicada no artigo anteriormente citado), é claro perceber que os riscos associados às transfusões no ano 2000, são muito inferiores aos sugeridos pela Sociedade Torre de Vigia, na brochura online no site da Organização (aqui). Pode-se dizer que esta campanha enganadora com respeito aos riscos de se aceitar uma transfusão devido às doenças transmitidas, continua pois esta publicação não foi revisada e continua a mencionar 1 morte por cada 13.000 frascos transfundidos, quando na realidade, o risco associado é inferior a 1 para 2.000.000 (ver artigo médico aqui). Uma coisa é exigir que um membro obedeça estritamente a uma interpretação da doutrina das Igrejas, mas outra bem diferente é ser-se desonesto na apresentação de informações médicas. Os membros têm direito ao consentimento informado. Será que as Testemunhas de Jeová possuem tal consentimento informado? Note com relação aos riscos associados ao uso do sangue, tão enfatizados pela Sociedade Torre de Vigia e seu Corpo Governante, o que Louderback-Wood afirmou no seu artigo: "Um leitor pode então concluir depois de ler a seção de risco médico, que o sangue de hoje, dada a adição de novas doenças é tão mortal quanto 1 para 13.000 garrafas. Se a tese da Sociedade é lógica, as doenças de hoje tornariam o sangue num veneno medicinal. A Sociedade distorce os riscos atuais de contrair hepatite ou HIV. Informar os seus leitores é importante, porque omitindo fatos relevantes também pode equivaler a uma deturpação que leva os leitores a uma falsa conclusão." Se você está a avaliar o risco de usar produtos sanguíneos, você deve saber que:
Existe realmente base bíblica para recusar transfusões de sangue? Ao longo deste artigo observamos como a Organização das Testemunhas de Jeová tem implantado na mente dos membros ideias incorretas sobre as transfusões de sangue, desde a equivalência entre uma transfusão e o alimento, bem como os zigue-zagues doutrinais com respeito à sua postura em relação ao uso de frações. Tornou-se claro como a liderança dá mais valor à "Lei" do que ao espírito desta, ao contrário do exemplo de Jesus ao supostamente violar a Lei Sabática e ser razoável ao lidar com quem padecia e sofria, colocando a vida humana acima das regras escritas. Ficou claro também como a Organização tem manipulado a informação que publica, de modo a criar um medo quase paranóico na mente das Testemunhas de Jeová com respeito às transfusões, até mesmo fazendo crer que estas não são assim tão necessárias, e que na verdade são muitíssimo perigosas. Para isso tem recorrido a informação seletiva dos factos a até mesmo descontextualizando citações para apoiar a sua doutrina. Ainda assim, a maioria das Testemunhas de Jeová estarão argumentando: "Mas a Bíblia fala sobre o uso do sangue e que nós nos devemos abster dele!" Vamos passar a analisar o que a Bíblia fala sobre o sangue e se existe base bíblica para rejeitar o sangue na medicina. Em primeiro lugar é preciso ter em mente que nos tempos bíblicos não existiam transfusões de sangue ou mesmo o seu fraccionamento. Para uma pessoa que vivia nos tempos bíblicos, o sangue era um líquido vital que simbolizava a vida da pessoa e sem o qual era impossível sobreviver. As pessoas estavam habituadas a verem outras sangrar até à morte no campo de batalha ou devido a ferimentos causados por animais selvagens. Elas percebiam que sem aquele líquido que lhes corria nas veias elas certamente morreriam. Lei dada a Noé Segundo a tradição judaica, após o dilúvio, Deus deu 7 leis a Noé pelas quais deveria viver, ele e a sua descendência:
Estas são as únicas leis que os judeus consideram vinculativas para os gentios, e nenhuma dizia respeito a comer sangue. A Torre de Vigia afirma que a ordem de refrear-se do sangue originou-se com Noé quando afirma: "Ele [Deus] só impôs esta restrição: não deviam consumir sangue. (Gênesis 9:3, 4)" - Sentinela de 1 de Outubro de 2008, pág.31 Mas é isso mesmo que o texto diz? Vejamos: "Somente não comam a carne de um animal com seu sangue, que é a sua vida." – Gênesis 9:4 Esta ordem é acerca de mostrar-se respeito pelo animal durante o ritual do abate. Não afirma que o sangue não possa ser comido. No sentido estrito do hebraico, significa que um animal não pode ter a sua carne arrancada para alimento enquanto ainda está vivo. Em geral, é entendido que significa que para mostrar respeito pela vida do animal, este tem de ser sangrado quando está sendo morto para alimento. Só assim não existiriam dúvidas de que a vida tinha realmente abandonado o corpo do animal e daí o sangue significar ou representar a vida do ser vivo (humano ou animal). Por isso, a lei proibia comer coisas estranguladas onde o símbolo da vida não tinha sido derramado. A Torre de Vigia usa esta passagem como texto-chave para mostrar que as transfusões de sangue não podem ser usadas, tentando aplicá-las ao consumo de sangue humano. Mas nada disso tem implicações nesta passagem. Até mesmo a Torre de Vigia no passado reconheceu que Gênesis 9:4 não se aplica a comer sangue, conforme mostrado no seguinte artigo da revista Golden Age (Idade de Ouro), referente à proibição das vacinas: "Todas as mentes razoáveis devem concluir que não foi o comer o sangue a que Deus se opôs, mas foi trazer o sangue do animal em contacto com o sangue do homem." – Golden Age (Idade de Ouro) de 4 fevereiro de 1931, pág. 294 (em inglês) Para mostrar que a Lei dada a Noé estava relacionada com o ato de matar um animal e não com o sangue em si mesmo, Deuteronômio 14:21 mostra que era permitido que os israelitas vendessem animais não-sangrados encontrados mortos para comida aos "residentes forasteiros" e "estrangeiros": "Não comam nenhum animal encontrado morto.Você pode dá-lo ao residente estrangeiro que mora nas suas cidades, e ele pode comê-lo; ou você pode vendê-lo a um estrangeiro." Isto acontecia porque os não-israelitas estavam debaixo da Lei de Noé, mas não debaixo da Lei Mosaica. Lei Mosaica Mas não diz a Lei Mosaica de que o sangue não deveria ser consumido como alimento? Depende! Em primeiro lugar, é preciso ler o que a lei mosaica dizia sobre o consumo de sangue e em que contexto. Vejamos a primeira vez que aparece tal ordem no Pentateuco: "Se algum homem da casa de Israel ou algum estrangeiro que mora entre vocês comer o sangue de qualquer criatura, eu certamente me voltarei contra aquele que comer o sangue, e o eliminarei dentre seu povo." – Levítico 17:10 A ordem expressa é clara! Nenhum sangue poderia ser consumido. Mas teria de ser forçosamente sempre assim? A passagem logo a seguir dá a resposta, nos versículos 13-16. Notem que são apresentadas duas situações possíveis. Iremos listar como (A) e (B): (A) "Se algum israelita ou algum estrangeiro que mora entre vocês, ao caçar, apanhar um animal selvagem ou uma ave que se pode comer, ele terá de derramar o sangue e cobri-lo com pó. Pois a vida de todo tipo de criatura é seu sangue, porque a vida está no sangue. Por isso eu disse aos israelitas: “Não comam o sangue de nenhuma criatura, porque a vida de todas as criaturas é seu sangue. Quem o comer será eliminado.”" (B) "Se alguém, quer israelita, quer estrangeiro, comer a carne de um animal que tenha sido encontrado morto ou que tenha sido dilacerado por um animal selvagem, esse homem terá de lavar suas roupas e se banhar em água, e ficará impuro até o anoitecer; então ficará puro. Mas, se ele não as lavar e não se banhar, responderá pelo seu erro.’” Nestas duas situações, o que determinava poder comer-se o animal sem ser sangrado e sem sofrer pena de morte por o fazer, era não existir o ato de abate pelo homem. Caso o animal fosse encontrado morto poderia ser comido, tanto pelo israelita como pelo residente forasteiro, tendo apenas estes de se lavarem e purificarem, ficando livres da impureza. Isso mostra claramente que não era o sangue em si que era sagrado ou não podia ser consumido per si. Visto que o sangue simbolizava a vida do animal, quando este era abatido pelo homem, a única forma de mostrar respeito pela vida que se tirava era sangrar o animal, de forma a que a sua vida não estivesse nele quando fosse consumido. Conforme nós sabemos, a Lei Mosaica cessou quando Jesus morreu (Romanos 10:4) e com isso todos os regulamentos e leis pelas quais os israelitas tinham de viver. Os cristãos têm de viver pela Lei do Cristo que não se baseia em leis escritas ou tradições baseadas no Antigo Testamento. O próprio Jesus expressou a ideia de que não mais se deveria considerar como importante o que entrava pela boca, mas sim o que procedia dela: "Não é o que entra pela boca do homem que o torna impuro, mas é o que sai da boca que o torna impuro.” – Mateus 15:11 "Não há nada fora de um homem que, entrando nele, possa torná-lo impuro; mas as coisas que saem do homem são as que o tornam impuro.” – Marcos 7:15 Como era encarado o consumo do sangue pelos primeiros cristãos? Para entendermos a visão dos primeiros cristãos, relembremos o exemplo que Jesus deixou, conforme visto acima. Ele demonstrou por várias vezes que dava mais valor à vida humana do que ao cumprimento estrito de um código de leis, neste caso a Lei Mosaica. Os casos em que curou ao Sábado, até mesmo permitindo que as pessoas fossem ter com ele para serem curadas, sem as repreender, mostrava que ele dava valor ao sofrimento humano e o seu desejo de as ajudar era superior ao desejo de cumprir um código escrito. Veja como ele expressou isso claramente: "Ele lhes disse: “Se um de vocês tiver uma ovelha, e essa ovelha cair num buraco no sábado, será que não vai agarrá-la e tirá-la dali?" – Mateus 12:11 "A seguir, ele lhes perguntou: “É permitido, no sábado, fazer o bem ou fazer o mal, salvar uma vida ou matar?” Mas eles continuaram calados." – Marcos 3:4 "Se um homem recebe a circuncisão num sábado para que a Lei de Moisés não seja violada, por que vocês estão tão irados comigo por eu ter curado completamente um homem num sábado?" – João 7:23 Conforme sabemos bem, a Lei apontava a necessidade de um resgatador, um sacrifício que conforme as profecias teria de morrer em benefício de muitos. O Novo Testamento mostra bem como na morte, Jesus pagou os nossos pecados de uma vez por todas e com isso cessou a necessidade do uso do sangue em rituais de sacrifício no templo, em que o sangue era usado como expiação pelo pecado (Hebreus 9:18-22). O sangue de Cristo derramado no madeiro, expia para sempre os pecados de todos aqueles que se aproximam de Deus em penitência e arrependimento genuíno, demonstrando fé no sacrifício do cordeiro que tira o pecado do mundo (Efésios 1:7). A Lei Mosaica deixou de ser aplicada por todo aquele que passou a acreditar no sacrifício eterno de Cristo: "Ele nos perdoou bondosamente todas as nossas falhas e apagou o documento manuscrito que consistia em decretos e estava em oposição a nós. Ele o removeu, pregando-o na estaca." – Colossenses 2:13, 14 Apesar da organização publicamente apoiar tal expressão inspirada, continua no entanto a procurar na Lei Mosaica a validação para a sua posição atual sobre o sangue. Note este exemplo: Ao usar como argumento a Lei Mosaica e renovar a sua validade para os nossos dias, a organização mina o valor do sacrifício de Cristo. Foi contra esta mentalidade que Paulo escreveu: "Mas a mente deles ficou insensível. Pois até hoje, quando o antigo pacto é lido, o mesmo véu permanece sem ser levantado, visto que ele só é removido por meio de Cristo. De fato, até hoje, sempre que Moisés é lido, um véu cobre o coração deles." – 2 Coríntios 3:14-15 A Organização é por isso, em muitos aspetos da sua postura, judaizante e legalista, como se as inúmeras regras que cria para ser aplicadas em praticamente todas as vertentes da vida (semelhante à Lei Mosaica que regia todos os aspectos do cotidiano de um israelita), fossem um melhor guia do que seguir o Espírito Santo e os princípios e valores deixados pelo Mestre e Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo. Como mencionou Raymond Franz no seu livro "Crise de Consciência", com respeito ao controle exercido pela Organização na vida dos seus membros, a ideia que permeia as mentes dos líderes da organização está bem sintetizada nas palavras de Milton Henschel quando este disse numa das reuniões semanais do Corpo Governante: "Se deixarmos os irmãos fazerem isto, não sabemos até onde irão." A ideia de que a posição que ocupam lhes dá o direito de "deixar" os irmãos fazerem ou não fazerem algo, tal como aceitar uma transfusão de sangue, celebrar um aniversário natalício ou qualquer outra coisa sobre a qual a Bíblia é omissa ou pelo menos não expressa de forma clara e inequívoca uma opinião, é similar à dos dias religiosos de Jesus que aos mandamentos da Tora, adicionaram inúmeras regras e leis que, segundo eles, preenchiam o vazio e inúmeras hipóteses deixadas de fora na escrita desta. Tais homens tornam-se na realidade "deuses" para os seus irmãos, impondo o que estes podem ou devem fazer e aquilo que não podem ou não devem fazer. O caso do uso das fracções e técnicas operatórias já mencionadas são um caso claro disso mesmo. Tal espírito de domínio sobre a fraternidade cristã por parte de uma elite superior é exatamente o oposto àquilo que Jesus ensinou quando disse: “Sabeis que os governantes das nações dominam sobre elas e que os grandes homens exercem autoridade sobre elas. Não é assim entre vós; mas, quem quiser tornar-se grande entre vós tem de ser o vosso ministro, e quem quiser ser o primeiro entre vós tem de ser o vosso escravo.” – Mateus 20:25-27 Estas palavras demonstram bem como Jesus admoestou os seus apóstolos a não se tornarem governantes dos seus irmãos, exercendo domínio ou autoridade sobre estes. tendo isto em mente como devemos encarar passagens do Novo Testamento onde supostamente são dadas ordens, em especial as relacionadas com o assunto do sangue? Atos 15:28-29 – Abster de quê? Além da Organização Torre de Vigia apelar para aquilo que o Antigo Testamento diz sobre o uso do sangue no cotidiano dos israelitas, tanto a nível religioso como dietético, ela tem usado a passagem de Atos 15:28-29 como base para reforçar a ideia de que a Bíblia condena o uso de transfusões de sangue. Vejamos novamente a passagem: "Pois pareceu bem ao espírito santo e a nós não impor a vocês nenhum fardo além destas coisas necessárias: que persistam em se abster de coisas sacrificadas a ídolos, de sangue, do que foi estrangulado e de imoralidade sexual. Se vocês se guardarem cuidadosamente dessas coisas, tudo irá bem com vocês. Saudações!” – Atos 15:28-29 As Testemunhas de Jeová entendem este "decreto" como sendo algo obrigatório para os cristãos e uma continuação da Lei Mosaica com respeito ao sangue. No entanto, é preciso entender esta passagem tendo em conta o contexto histórico e religioso do momento. Em primeiro lugar, nunca os cristãos entenderam que tal "decreto" era obrigatório ou uma ordem divina por tempo indefinido. Até mesmo o Pastor Russell não entendeu esta passagem como uma obrigação permanente para os cristãos. Com vimos antes, nem mesmo a lei dada a Noé sobre a forma correta de matar um animal dizia alguma coisa sobre comer o sangue do animal, mas tão somente não comer a carne junto com o sangue, em sinal de respeito pela vida ao se abater o animal para alimento. Vimos também que um israelita e um forasteiro poderiam comer um animal encontrado morto e por isso não estando sangrado. Porquê? Porque estes não tinham tido qualquer participação em tirar a vida do animal. Tão simples quanto isto. Assim, a ordem de Atos a) não se pretendia ser uma lei eterna para todos as pessoas e em todos os tempos b) não se referia ao uso do sangue em transfusões. A situação relatada em Atos é muito específica. Os cristãos judeus estavam a criar problemas aos cristãos gentios, particularmente em relação à circuncisão. Milhares de gentios estavam convertendo-se ao cristianismo através da pregação zelosa de Paulo, Barnabé e outros que empreenderam divulgar as Boas Novas pelo império romano. Tais homens e mulheres gentios, estavam sendo ensinados por estes que não havia necessidade de seguir a Lei Mosaica, em virtude do cumprimento desta lei na morte e ressurreição de Jesus. Mas os cristãos judaizantes diziam o oposto. Afirmavam que era necessário seguir certos requisitos da Lei Mosaica e que sem este cumprimento não poderiam tornar-se cristãos ou ser aceitáveis para Deus e serem salvos (Atos 15:1). A Nova Enciclopédia Católica, explica sobre o termo "judaizantes": "Um partido de Cristãos Judeus na Primitiva Igreja, que quer mantinha que era necessária a circuncisão e a observância da Lei Mosaica para a salvação e por consequência desejavam impôr isto aos conversos Gentios, ou pelo menos consideravam que sendo obrigatórias para os Cristãos Judeus." Os apóstolos e anciãos reuniram-se para discutir a aplicação da Lei Mosaica para os cristãos gentios e chegaram à conclusão de que esta não mais era obrigatória e necessária. Contudo, recomendaram as palavras acima com 4 orientações a que os gentios deveriam dar consideração:
O objetivo desta pequena lista (a lei mosaica tinham outras 600 leis), foi para evitar que os cristãos judeus tropeçassem. Isto até mesmo foi explicado na Watch Tower 15 de Abril de 1909, págs. 116-117 e este continua a ser o entendimento no atual mundo cristão sobre esta passagem. A Nova Enciclopédia Católica declara: "Estas quatro proibições foram impostas para o bem da caridade e união. Ao proibirem práticas que eram tidas como tendo especial aversão pelos Judeus, a sua observância era necessária para evitar chocar os irmãos Judeus e criar uma relação o mais fácil possível entre as duas classes de Cristãos. Com o desaparecimento da comunidade judaico-cristã em Jerusalém no período da rebelião (A.D. 67-70), a questão acerca da circuncisão e a observância da Lei cessaram de ser importantes para a Igreja e rapidamente tornou-se um assunto morto." (The Catholic Encyclopedia, Volume III, Copyright 1910 em inglês) Como os eruditos e até mesmo Charles Taze Russell chegaram à mesma conclusão? Em primeiro lugar, a Lei Mosaica tinha cessado de ser aplicada e não fazia qualquer sentido que aos cristãos fosse requerido reter apenas uma porção dela. Especialmente tendo em conta que as leis enumeradas em Atos nem mesmo eram as principais leis da Lei Mosaica ou as únicas a terem de ser seguidas, caso a Lei Mosaica devesse vigorar. O apóstolo Tiago explica porque foram estes 4 aspectos da Lei mencionados em Atos 15:21: "Pois, desde os tempos antigos, Moisés tem os que o pregam em cada cidade, porque ele é lido em voz alta nas sinagogas todo sábado.” Esta frase é importante para perceber o real motivo destas orientações. A Lei de Moisés era lida nas sinagogas a cada Sábado. A passagem de Levítico 17:1 a 18:27 aplicava-se tanto a Judeus como a Gentios. Esta passagem tem os mesmos 4 requerimentos, listados na mesma ordem que é transmitida em Atos 21:25:
Estas eram as leis obrigatórias, tanto para os judeus como para os residentes forasteiros vivendo no antigo Israel. Estas ordens divinas eram de grande importância porque já vinham desde o tempo de Noé, no princípio dos tempos:
É por isso que estes 4 orientações divinas significavam tanto para os judaizantes cristãos e porque os apóstolos concluíram que apenas estas normas eram necessárias para evitar que as congregações repletas de judeus tropeçassem. É interessante analisarmos aqui mais um aspecto para percebermos porque razão se pode afirmar que estas directivas não seriam por tempo indefinido. Relembremos a primeira directiva apostólica: "..que persistam em se abster de coisas sacrificadas a ídolos..." Assumindo, como fazem as Testemunhas de Jeová em relação à abstenção do sangue, que tais normas eram um mandamento eterno e permanente para os cristãos, teríamos de assumir que consumir carne sacrificada a ídolos também o seria, certo? Então como entender as palavras de Paulo aos Coríntios, escritas cerca de 20 anos após o chamado "decreto apostólico"? "4 Quanto a comer alimentos oferecidos a ídolos, sabemos que o ídolo não é nada no mundo, e que não há outro Deus, senão um só. 5 Pois, embora haja os que são chamados deuses, quer no céu, quer na terra, assim como há muitos “deuses” e muitos “senhores”, 6 para nós há realmente um só Deus, o Pai, de quem procedem todas as coisas, e nós existimos para ele; e há um só Senhor, Jesus Cristo, por meio de quem são todas as coisas, e nós existimos por meio dele.7 No entanto, nem todos têm esse conhecimento. Mas alguns, devido à familiaridade que tinham com os ídolos, comem o alimento como algo sacrificado a um ídolo, e a consciência deles, que é fraca, fica contaminada. 8 Mas o alimento não nos aproximará de Deus; não seremos piores se não comermos, nem melhores se comermos. 9 Tomem cuidado, porém, para que o seu direito de escolha não se torne de algum modo uma pedra de tropeço para os que são fracos. 10 Pois, se alguém vir você, que tem conhecimento, tomando uma refeição no templo de um ídolo, será que a consciência daquele que é fraco não ficará ousada a ponto de ele comer alimentos oferecidos a ídolos? 11 Assim, pelo conhecimento que você tem, está sendo arruinado aquele que é fraco, seu irmão pelo qual Cristo morreu. 12 Quando vocês pecam assim contra os seus irmãos e ferem a consciência fraca deles, estão pecando contra Cristo. 13 É por isso que, se o alimento fizer o meu irmão tropeçar, nunca mais comerei carne alguma, para que eu não faça o meu irmão tropeçar." – 1 Coríntios 8:4-11 "25 Comam de tudo o que se vende no açougue, sem fazer perguntas por causa da sua consciência, 26 pois “a Jeová pertence a terra e tudo o que nela há”. 27 Se algum descrente os convidar para uma refeição, e vocês quiserem ir, comam de tudo o que se puser diante de vocês, sem fazer perguntas por causa da sua consciência. 28 Mas, se alguém lhes disser: “Isso é algo oferecido em sacrifício”, não comam, por causa daquele que lhes disse isso e por causa da consciência. 29 Não me refiro à sua própria consciência, mas à da outra pessoa. Pois, por que a minha liberdade deveria ser julgada pela consciência de outro? 30 Se eu dou graças quando participo de uma refeição, por que serei criticado por causa daquilo pelo qual dou graças? 31 Portanto, quer vocês comam, quer bebam, quer façam qualquer outra coisa, façam todas as coisas para a glória de Deus. 32 Não se tornem motivo de tropeço para judeus, nem para gregos, nem para a congregação de Deus, 33 assim como eu estou tentando agradar a todos em todas as coisas, não buscando a minha própria vantagem, mas a do maior número de pessoas, para que sejam salvas." - 1 Coríntios 10:25-33 Fica claro que, embora o decreto de Atos fale em abster-se de comer coisas sacrificadas a ídolos, Paulo torna claro que não exista nada de errado com essa prática. Ele disse que só era errado caso fizesse outros tropeçar, neste caso os judaizantes ou de consciência fraca. O mesmo princípio aplica-se ao sangue. Atos 15 inclui comida sacrificada a ídolos, sangue e animais estrangulados exactamente porque tais coisas faziam tropeçar os irmãos judeus que ainda estavam apegados à Lei Mosaica e cuja leitura era feita a cada Sábado nas Sinagogas e não porque estas fossem ofensivas a Deus. E isto tornou-se cada vez menos um assunto importante após a destruição do templo em 70 A.D. e o término dos rituais em que animais eram sacrificados e seu sangue usado como símbolo religioso. Com o tempo, tal assunto caiu mesmo no esquecimento. Abster de sangue nunca é mencionado no Novo Testamento em qualquer outra circunstância, nem mesmo nas inúmeras cartas de Paulo aos cristãos gentios. Não é usado como argumento para expulsar um membro, ou parar de ter associação com ele, como em 1 Coríntios 5. Quer em Revelação 21:8 ou 1 Coríntios 6 o assunto do sangue não listado como sendo uma das razões pelas quais alguém deixaria de ter vida eterna. Se o evitar consumir sangue continuasse a ser uma doutrina ou lei bíblica assim tão premente, veríamos tal assunto ser explanado ao longo do Novo Testamento de modo mais intenso e claro. Afinal, a maior parte do Novo Testamento é dirigido aos cristãos gentios! Ao lado de pecados tais como a fornicação, assassinato e idolatria, tão constantemente mencionados no Novo Testamento, não encontramos o tópico do sangue. Além de tudo isto, é preciso ter em mente que na Bíblia a questão do sangue está sempre relacionada com o ato de matar: seja tirar a vida a um animal para alimento, quer tirar a vida de outro ser humano (ex. assassinato). A lei do sangue servia, conforme já foi dito, para realçar o valor da vida e com o objectivo de se mostrar respeito por ela. Era por isso uma lei que considerava a vida, não o sangue em si mesmo, como algo santo e precioso. O sangue era apenas um símbolo da vida. Assim como um anel não é mais sagrado aos olhos de Deus do que o casamento que ele representa, do mesmo modo a vida humana e animal em si mesma é mais importante do que o seu símbolo – o sangue. Mas para as Testemunhas de Jeová, é realmente o inverso! Permite Deus transfusões de sangue de modo natural?1 Em 1990 a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados de Nova Iorque, Inc. fez uma das suas declarações mais importantes de sempre sobre a sua proibição de transfusões de sangue para os seus membros – as Testemunhas de Jeová. A seção "Perguntas dos Leitores" da edição de 1.º de junho de 1990 da revista A Sentinela, páginas 30-31 diz o seguinte: "É significativo que o sistema sanguíneo duma gestante é separado do sistema do feto; os seus tipos sanguíneos não raro são diferentes. O sangue da mãe não passa para o feto. Elementos formados (células) do sangue materno não cruzam a barreira placentária para penetrar no sangue do feto nem o faz o plasma como tal. Com efeito, se acidentalmente o sangue da mãe se misturar com o do feto, podem-se desenvolver mais tarde problemas de saúde (incompatibilidade de Rh ou ABO). Contudo, algumas substâncias do plasma passam para a circulação do feto. Será que as proteínas plasmáticas, tais como a imunoglobulina e a albumina também passam? Sim, algumas. A gestante tem um mecanismo ativo pelo qual um pouco de imunoglobulina transfere-se do sangue da mãe para o do feto. Visto que essa transferência natural de anticorpos para o feto ocorre em toda gestação, os bebês nascem com certo grau de imunidade normal que os protege contra determinadas infecções. Algo similar acontece com a albumina, que os médicos talvez prescrevam como tratamento para estados de choque ou outros quadros clínicos. Os pesquisadores provaram que a albumina plasmática também é transportada, embora menos eficientemente, pela placenta, da mãe para o feto. Esta transferência natural de algumas frações protéicas do plasma para o sistema sanguíneo de outrem (o feto) pode ser outro fator a ser considerado quando o cristão tem de decidir se aceitará imunoglobulina, albumina ou injeções similares de frações do plasma. Uma pessoa talvez decida que pode aceitar isso em boa consciência; ou talvez conclua que não pode. Cada indivíduo tem de resolver o assunto em base pessoal perante Deus." Na mente dos líderes da Torre de Vigia, pesquisadores tinham provado claramente que estes componentes do sangue humano transferem-se naturalmente de um ser humano (a mãe) para outro ser humano (o feto). Claramente, na mente da Torre de Vigia, enquanto "organização escolhida de Deus", Jeová não pode estar a violar a Sua própria lei. Assim, a Torre de Vigia permitiu que as Testemunhas de Jeová usassem a sua própria liberdade de escolha e de consciência para decidirem se aceitam transfusões de alguns componentes específicos do sangue. Isso é muito diferente de uma ação de desassociação ou dissociação que significaria a perda de Deus, morte certa no Armagedom e corte de relações com família e amigos por conscientemente aceitar uma transfusão de um componente "proibido" do sangue ou uma transfusão de sangue total. A Torre de Vigia voltou a enfatizar esta mudança doutrinal sobre a transferência natural de componentes do sangue na seção "Perguntas dos Leitores" da edição de 15 de junho de 2000 da revista A Sentinela, páginas 29-31. Mas, apensar desta mudança em 1990, a Torre de Vigia continuou a proibir transfusões de sangue total humano e os seguintes componentes do sangue: glóbulos vermelhos, plaquetas e plasma. A Torre de Vigia também proibiu oficialmente transfusões de glóbulos brancos, exceto se estas fossem chamadas procedimento "peripheral blood stem cell autographing" (que na realidade é outro nome para um tipo de transfusão de glóbulos brancos). Mas, e se houvesse uma maneira em que Jeová Deus de fato permitisse a transferência natural de sangue total entre dois humanos? E se investigadores tivessem provado a existência de uma transferência de sangue total exatamente como provaram a transferência natural de albumina, qual seria o significado disto? Obviamente, conforme se mostrou em 1990, a Torre de Vigia (na sua qualidade de "organização escolhida de Deus") reconheceu claramente que se investigadores de fato provassem que um componente do sangue se transfere naturalmente entre dois humanos, então Jeová Deus não pode violar a Sua própria lei. E se Jeová não pode violar a Sua própria lei, transfusões de sangue total, caso a sua existência fosse provada, teriam de ser um assunto para a consciência e liberdade de escolha das Testemunhas de Jeová e não seriam motivo para uma ação de desassociação ou dissociação. Então, existe alguma investigação com evidência visual que prove que Deus de fato permite que sangue humano total se transfira naturalmente entre dois seres (indivíduos) humanos? Bem, independentemente da sua opinião sobre o assunto do aborto, lembre-se que a "organização escolhida de Deus", a Torre de Vigia, declarou publicamente que um feto é um ser humano individual. Ao longo dos últimos 20 anos tem havido uma grande quantidade de investigação científica sobre gêmeos. Porquê? Graças a alguma da tecnologia hoje existente para ajudar as mães e os pais a ter filhos, mais casais do que nunca antes estão a ter gêmeos, trigêmeos e mais. Para as mães e os pais tão desesperados por ter um bebê, não há nada como ter dois ou mais bebês saudáveis. Mas gêmeos podem ter riscos como em alguns poucos casos de gravidezes monocoriônicas (MC) -- daí a necessidade de investigação. O que é uma gravidez monocoriônica? É uma maneira elaborada de dizer que a mãe vai ter gêmeos idênticos. Um quadro no Apêndice 2 mostra como os fetos são formados desde o momento em que o óvulo é fertilizado com esperma. O que torna única a gravidez monocoriônica é que os fetos (seres humanos individuais) partilham a placenta. A placenta é o órgão que une o feto ao útero da mãe e permite uma troca metabólica para deixar o feto viver à custa dos nutrientes da mãe. Investigadores como o Dr. Geoffrey Machin e o Dr. M. J. O. Taylor (para nomear apenas alguns) publicaram investigações notáveis sobre gravidezes monocoriônicas em revistas médicas reconhecidas como Ultrasound in Obstetrics and Gynecology. Então, o que tem a ver uma gravidez de gêmeos idênticos (gestação de gêmeos monocoriônicos) com uma transfusão de sangue total humano? Vejamos a investigação médica. O Dr. Machin publicou uma opinião intitulada "The monochorionic twin placenta in vivo is not a black box" (A placenta de gêmeos monocoriônicos in vivo não é uma caixa negra) na edição de janeiro de 2001 de Ultrasound in Obstetrics and Gynecology, Volume 17, Número 1, páginas 4-6). O Dr. Machin faz claramente referência a ligações vasculares na placenta em gravidezes monocoriônicas. Estas ligações vasculares unem o sistema sangüíneo de ambos os fetos na placenta. Há três maneiras diferentes em que os sistemas sangüíneos são ligados: artéria com artéria (A-A), veia com veia (V-V) e artéria com veia (A-V). A segunda frase do quinto parágrafo do artigo do Dr. Machin diz tudo: "A maioria das placentas de gêmeos MC têm ligações A-V, portanto usualmente há transfusões entre os gêmeos." Ora aí está, investigações médicas reconhecidas identificaram dois seres humanos individuais (fetos) transferindo naturalmente sangue total entre si. Isto não é algo novo, conforme se mostra na lista de referências no fim do artigo do Dr. Machin. Claramente, a lista de referências mostra que tinha sido feita uma grande quantidade de investigação médica neste campo nas décadas de 1980 e 1990. Mas porquê fazer esta investigação? Cerca de 88% do tempo, fetos monocoriônicos nascem como belos gêmeos. Mas, em cerca de 12% dos casos, ocorre uma condição chamada síndroma da transfusão gêmeo a gêmeo (TGG). Síndroma TGG significa que um feto doa demasiado sangue ao outro feto através das ligações vasculares da placenta partilhada. Se for deixada sem tratamento, a síndroma TGG tem uma taxa de sobrevivência de 20%. O Dr. Taylor et al. publicaram um artigo de investigação médica intitulado "Identification of arterio-venous anastomoses in vivo in monochorionic twin pregnancies: preliminary report" (Identificação de anastomoses artério-venosas in vivo em gravidezes de gêmeos monocoriônicos: relatório preliminar) na edição de setembro de 2000 da revista Ultrasound in Obstetrics and Gynecology, Volume 16, Número 3, páginas 218-222. Ao ler o artigo, tenha em mente que "anastomoses artério-venosas" (AAV) são ligações entre artérias e veias. Uma "anastomose artério-arterial" (AAA) é uma ligação de artéria para artéria. O artigo médico fornece mais investigações que identificaram tanto ligações AAA como AAV na placenta partilhada. A investigação de Taylor apresenta fotografias da própria placenta e outras imagens usando ultra-som espectral de Doppler. Assim, o leitor pode ver claramente por si mesmo as ligações vasculares entre o sistema sangüíneo de um feto e o sistema sangüíneo do outro feto na placenta partilhada pelos dois. Taylor et al. também identificaram para que lado o sangue total fluía naturalmente de um gêmeo para o outro gêmeo nestas ligações vasculares usando estudos formais de injeções e as técnicas de ultra-som Doppler. Tal como o Dr. Machin, a lista de referências do artigo de Taylor mostra que a comunidade médica conhece perfeitamente estas transferências naturais de sangue já por algum tempo. Alguns talvez expressem a preocupação de a Torre de Vigia poder manter em vigor a proibição sobre transfusões de sangue total argumentado que a síndroma de Transfusão Gêmeo a Gêmeo (TGG) é uma "excentricidade da natureza" que "mata" humanos. No entanto, este tópico trata das transferências naturais de sangue em TODOS os fetos gêmeos monocoriônicos e não apenas nos 12% de fetos gêmeos monocoriônicos (Taylor et al.) que desenvolvem a síndroma TGG. Então, porque surge a síndroma TGG? O artigo de opinião do Dr. G. Machin afirma o seguinte: "As ligações atravessam uma zona especial da placenta MC, chamada equador vascular, que se estende aproximadamente em ângulos retos até uma linha que une as duas interseções de cordões." Assim, o Dr. Machin explica que os sistemas sangüíneos de cada feto estão sendo ligados numa zona especial (chamada "equador vascular") na placenta que os fetos partilham. Mais adiante no artigo de opinião, Machin afirma isto: "Ligações vasculares cruzam o equador de três maneiras: artério-arterial (A-A), veno-venosa (V-V) e artério-venosa (A-V). A anatomia destas ligações é explicada e ilustrada no nosso artigo recente.6 "A maioria das placentas de gêmeos MC têm ligações A-V, portanto usualmente há transfusões entre os gêmeos. A pergunta é: por que razão a maioria dos gêmeos MC não desenvolve TGG? A resposta é que tudo depende da combinação e direção das ligações. Os resultados finais em gravidezes de gêmeos MC são largamente determinados pelo número, tipo e diâmetro dos vasos existentes na superfície da placenta. Embora ocorra sempre transfusão ao longo de ligações A-V, outras ligações (incluindo A-A, V-V e A-V em sentido contrário) podem permitir fluxo de volta para o dador. Quando existe fluxo unidirecional sub-compensado numa A-V 'causativa', desenvolve-se TGG. Cada placenta MC tem uma anatomia vascular única, e o espectro da severidade da TGG depende da anatomia exata de cada placenta MC. Estudos de injeção de líquido na placenta pós-parto mostraram que placentas MC de TGG geralmente têm uma anatomia vascular menos complicada, na qual uma ligação A-V causativa é pobremente compensada, nos casos em que é compensada, por quaisquer outras ligações. Placentas MC com muitas ligações permitem compensação e geralmente não desenvolvem TGG." Conforme o Dr. Machin sugere no artigo de opinião, fetos partilhando uma placenta é uma situação sub-ótima em comparação com ter uma placenta para cada feto. Mas, a resposta de Jeová Deus para proteger os fetos numa gestação monocoriônica (MC) é providenciar uma complexa estrutura vascular natural na zona do "equador vascular" da placenta, com muitas artérias e ligações de veias. O aumento em ligações vasculares providencia mais (não menos) sangue total para transferência natural entre fetos. E quanto mais ligações e transfusões naturais de sangue total houver, as chances de ocorrência de síndroma TGG são significativamente reduzidas e não aumentadas. É surpreendente, para não dizer completamente inacreditável, que uma organização como a Sociedade Torre de Vigia (Testemunhas de Jeová), que se gaba de ter um quadro de médicos, Serviços de Informações Hospitalares (SIH) e Comissões de Ligação com Hospitais (COLIH) para dar assistência a pacientes Testemunhas de Jeová, e que analisa e cita milhares de periódicos médicos e científicos, nunca tenha trazido à atenção das Testemunhas de Jeová esta "transferência natural" de sangue total entre dois indivíduos humanos. Concluímos assim que a investigação médica tem identificado, já por algum tempo, que Jeová Deus na verdade permite a transferência natural de sangue total entre dois humanos distintos. Investigadores provaram claramente que o fenômeno existe e até apresentaram imagens nos seus estudos de gravidezes monocoriônicas. Conforme mostrado em 1990, a Sociedade Torre de Vigia (enquanto "organização escolhida de Deus") reconheceu que se investigadores de fato provarem que um componente do sangue se transfere naturalmente entre dois humanos, então Jeová Deus não pode violar a Sua própria lei. A Torre de Vigia reconheceu que a mãe e o feto são dois seres humanos distintos. Obviamente, dois fetos também são considerados seres humanos distintos pela Torre de Vigia. E visto que Jeová não pode violar a Sua própria lei, então transfusões de sangue total devem ser um assunto para a consciência e livre escolha das Testemunhas de Jeová. Agora não existe (e nunca devia ter existido) qualquer justificação para uma ação de desassociação ou dissociação contra aquelas Testemunhas de Jeová que aceitam ou aceitaram transfusões de sangue total. Conclusão A Torre de Vigia, usando textos bíblicos mal aplicados e descontextualizados, tornou o sangue mais valioso do que a própria vida que ele representa, tornando uma lei dietética e ritualista do passado, num livre-passe para uma provável morte prematura. Pior que isso, tem levado as Testemunhas de Jeová a acreditar que as transfusões de sangue são mais perigosas do que os produtos ou alternativas que ela permite. A verdade é outra, conforme pudemos apresentar. A doutrina do sangue tem sido uma doutrina em constante mutação e o espectro do que é "aceitável" pela comunidade religiosa é cada vez maior. Afinal, podendo-se aceitar hemoglobina animal que mais barreiras existem para quebrar? O que é triste no meio disto tudo, é que a maioria das Testemunhas de Jeová continua impávida e serena, como ovelhas levadas para o abate. Não tendo poder decisório em suas vidas com respeito a questões tão importantes, tais como aquelas que dizem respeito à sua saúde, elas acreditam implicitamente que a forma como a Organização as lidera e instruí a este respeito, é realmente a melhor forma e a que mais as protege. Acreditam também de que é a vontade de Deus que elas morram uma morte prematura, ao invés de aceitar o sangue total ou algum dos componentes proibidos pela Organização quando existem uma necessidade para isso. É possível que a evolução da medicina permita que no futuro todo este drama vivido quase diariamente nos hospitais seja coisa do passado e que mais nenhuma Testemunha venha a morrer por causa da falta de sangue ou derivados. Mas enquanto isso não acontecer, homens, mulheres e crianças estarão à mercê dos caprichos e ditames de uma organização religiosa que muda de opinião como quem muda de camisa, e isto sem levar em conta as implicações trágicas na vida dos seus membros. Por isso, consideramos importante elucidar e esclarecer a todos sobre o assunto do sangue, para que as pessoas tomem decisões realmente em consciência e na posse de todos os dados que possam resultar na melhor decisão possível. Alguém disse que "a melhor transfusão é aquela que nunca se faz", mas infelizmente, por vezes é a única maneira de salvarmos a nossa vida e a vida daqueles que amamos. 1 http://desperta.weebly.com/reflexotildees/transfusoes-de-sangue-porque-as-testemunhas-de-jeova-estao-erradas-em-rejeita-las Por, Ex-Membro das Testemunhas de Jeová, António Madaleno Agradeço ao meu amigo e irmão em Cristo, José Gomes, cujo recente artigo Questão do Sangue, serviu de base para este artigo e dos quais alguns elementos foram utilizados. Fontes usadas na matéria: http://www.jwfacts.com/watchtower/blood-transfusions.php http://ajwrb.org/ https://seguindoaspegadasdaverdade.wordpress.com/2015/12/09/questao-do-sangue/ http://questaodosangue.blogspot.pt/ *Este artigo não pretende ser apologista do uso de transfusões de sangue e entende que estas têm sempre um grau de perigo, entendendo no entanto que o seu uso em muitos casos, tem sido a melhor hipótese de sobrevivência que muitas pessoas têm.
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