Esta pergunta levanta bastante polémica entre as diversas sensibilidades e grupos religiosos cristãos. Há aqueles que acreditam que a vida é tão sagrada, que em caso algum o homem deve fazer uso de um instrumento de defesa pessoal, de modo a matar aquele que lhe tenta fazer mal. Outros argumentam que este assunto é exclusivamente do foro pessoal e que ninguém deve impôr a sua consciência a outros. Argumentam também que há razões válidas para se possuir armas de fogo para defesa pessoal, especialmente em países onde a violência grassa e onde a qualquer momento a pessoa pode ver a sua vida e de seus entes queridos em perigo, mesmo que esteja na segurança do lar. Vamos tentar abordar este assunto, por analisar o que a organização Torre de Vigia tem publicado sobre o tema. Veremos os seus argumentos e tentaremos desmontá-los, por analisar o que a Bíblia diz como um todo sobre este assunto. O artigo que servirá de base encontra-se aqui. Colocaremos primeiro os argumento da Torre e depois a nossa análise. O artigo da revista A Sentinela de Julho de 2017, em Perguntas dos Leitores, levanta a questão: "Será que é certo um cristão ter uma arma de fogo para se proteger de outros humanos?" O artigo passa a dizer: Aparentemente, segundo a Torre, e ao contrário do que afirma na frase inicial, os "cristãos" (leia-se as Testemunhas de Jeová), não podem fazer tudo ao seu alcance para se proteger. Fazer tudo, implica obrigatoriamente tomarem todas as medidas necessárias para sua protecção e não apenas aquelas que os seus líderes acham que devem tomar. O autor deste texto comete logo de seguida um erro ao forçar o seu argumento ainda antes de o apresentar e deixar à consideração do leitor. Define logo à partida que "os princípios da Bíblia" impedem um cristão de possuir armas de fogo. Mas será que, quer os princípios bíblicos, quer as próprias leis e orientações divinas não revelam exatamente o contrário? Sem dúvida que para Deus a vida humana é sagrada. Isso não está em questão. A questão reside na pergunta: "Até que ponto posso ir, de modo a preservar a minha vida e a da minha família, quando confrontado com uma situação de potencial risco de vida?" Pela lógica apresentada no parágrafo, a vida é tão sagrada que em momento algum pode ser tirada! É interessante os textos escolhidos pelo escritor do texto para defender esta posição, quando cita Deuteronômio 22:8 e o Salmo 51:14. Mas será que estes textos sequer têm a ver com este assunto? Vejamos o que dizem: "Quando edificares uma casa nova, farás no telhado um parapeito, para que não ponhas culpa de sangue na tua casa, se alguém de alguma maneira cair dela." –Deuteronômio 22:8 (Almeida Revista e Corrigida) "Livra-me da culpa dos crimes de sangue, ó Deus, Deus da minha salvação! E a minha língua aclamará à tua justiça." – Salmo 51:14 (Nova Versão Internacional) Com respeito à passagem citada de Deuteronômio 22:8, o autor parece desperceber a diferença de conceito entre culpa de sangue por negligência, como no caso da construção de uma casa sem as devidas proteções e matar alguém que ameaça a nossa vida. Enquanto que no primeiro caso existiria realmente culpa de sangue, porque não foram tomadas as medidas necessárias para proteger-se de um acidente fatal, o mesmo não se poderia dizer de alguém que mata ou fere uma pessoa que tenta tirar sua vida ou tenta agredi-la de modo violento. Com respeito ao Salmo 51:14, percebemos bem como Davi tinha culpa de sangue por aquilo que havia feito e sua consciência pesava ao dizer tais palavras. Estas palavras não deveriam ser tiradas do seu contexto e usadas para defender o que o autor pretende defender. É desonestidade intelectual! Porque o autor deste texto omitiu no seu artigo a passagem bíblica que mostra exatamente a situação que se pretende discutir e que se encontra em Êxodo 22:2? Notem o que a Lei Mosaica dizia de modo taxativo: “Se um ladrão for pego arrombando uma casa, for ferido e morrer, quem o matou não terá culpa de sangue." – Tradução do Novo Mundo Esta passagem sim, aplica-se à situação da defesa pessoal! Mas o autor do artigo preferiu ignorá-la! Porquê? Porque seria incómodo e derrubaria logo o seu argumento de que a vida é tão sagrada que caso alguém mate uma pessoa que pretende fazer-lhe mal, estará a incorrer em "culpa de sangue". Mais uma vez nota-se a desonestidade intelectual do autor. Exatamente! Quando a pessoa se vê numa situação em que a sua vida está em perigo, ela recorrerá a tudo o que estiver ao seu alcance para neutralizar o agressor, nem que para isso tenha que matá-lo como último recurso. Afinal não é assim que atuam igualmente as autoridades quando confrontadas com um criminoso? Será que elas também têm culpa de sangue ao matarem uma pessoa armada e agressiva? Claro que não! Com respeito ao exemplo dado e que pretende criar o medo no leitor, é preciso que se diga que o uso de uma arma requer sempre que a pessoa tenha a noção de quando a deve usar e quando é melhor não fazer uso dela. Por vezes, usar uma arma pode salvar-lhe a vida e outras vezes pode piorar a situação. Mas essas decisões devem ser feitas ao momento e segundo as circunstâncias e jamais se pode criar uma regra absoluta tal como o autor do texto pretende fazer. A nota de rodapé correspondente ao asterisco diz: Com que lógica é que o autor do artigo coloca como possível a pessoa ter uma arma como defesa e protecção de "animais selvagens", mas coloque como negativo a mesma posse de arma para se defender de pessoas que simbolicamente podem ser equiparadas a "animais selvagens", devido à sua sede por sangue e violência? O artigo continua: Este argumento tem diversas falácias e uma lógica que não é coerente com o contexto da situação. Em primeiro lugar, seria no mínimo estranho e incoerente que Jesus orientasse seus discípulos a adquirirem espadas se não fosse para sua protecção! Dizer que Jesus lhes pediu para adquirirem espadas com o intuito de lhes mostrar que em circunstância alguma as poderiam usar é forçar o argumento. Jesus sabia que eles iriam sofrer muitos perigos e as espadas, como instrumento dissuasor e de defesa, poderia ser necessário ao enfrentarem tais perigos na estrada. Lembram-se da parábola do "bom samaritano"? O homem foi assaltado e brutalmente espancado por homens violentos com o intuito de roubarem seus pertences. Caso ele tivesse com ele uma espada não poderia ele tê-la usado? Seria isso errado? À luz da Lei Mosaica não o seria! Do mesmo modo, os apóstolos e discípulos iriam pregar em territórios longínquos, onde salteadores e animais selvagens e até mesmo inimigos poderiam estar de tocaia para os matar. Não teriam qualquer culpa de sangue em defender suas vidas! Quando o artigo cita o que aconteceu no Jardim de Gêtsemani, esquece-se que a acção de Pedro foi intempestiva e emocional e que ia contra aquilo que Jesus já lhes havia dito sobre a necessidade de ser entregue aos homens para ser morto. Por isso Jesus disse a Pedro: "Então, Jesus disse-lhe: Mete no seu lugar a tua espada, porque todos os que lançarem mão da espada à espada morrerão. 53 Ou pensas tu que eu não poderia, agora, orar a meu Pai e que ele não me daria mais de doze legiões de anjos? 54 Como, pois, se cumpririam as Escrituras, que dizem que assim convém que aconteça?" – Mateus 26:52-56 (Almeida Revista e Corrigida) sublinhado acrescentado A frase final revela porque a acção de Pedro foi desnecessária e um erro. Era necessário que Jesus fosse entregue para ser morto, tal como as Escrituras haviam profetizado sobre o Messias. As palavras de Jesus antes “ponha sua espada no lugar,” evidentemente que ele não estava dizendo que a deixasse lá para sempre. Isto contradiria o que ele já havia dito aos discípulos apenas algumas horas antes. A espada de Pedro era necessária para proteger sua própria vida do perigo, mas completamente desnecessária para defender o Filho de Deus que, caso quisesse, teria à sua disposição milhares de anjos para o fazer. Vemos assim que o autor parece não fazer caso dos diferentes contextos e suas aplicações, tentando forçar situações individuais e fazer disso uma regra absoluta para todos os casos. A passagem de Miquéias 4:3 está mal aplicada porque aquilo que está descrito nela tem cumprimento quando Deus, por meio de Seu Filho, "fará julgamento entre muitos povos e resolverá as questões referentes a poderosas nações distantes". Só depois deste julgamento é que a passagem diz: "Eles transformarão as suas espadas em arados, E as suas lanças em podadeiras. Nação não levantará espada contra nação,Nem aprenderão mais a guerra. 4 Eles se sentarão cada um debaixo da sua videira e debaixo da sua figueira, Sem que ninguém os faça ter medo, Porque a boca de Jeová dos exércitos disse isso.Eles transformarão as suas espadas em arados, E as suas lanças em podadeiras. Nação não levantará espada contra nação,Nem aprenderão mais a guerra. 4 Eles se sentarão cada um debaixo da sua videira e debaixo da sua figueira, Sem que ninguém os faça ter medo, Porque a boca de Jeová dos exércitos disse isso." – Tradução do Novo Mundo Esta passagem tem o seu cumprimento no reinado milenar de Cristo e não antes! O cumprimento deste texto depende inteiramente da acção divina sobre as nações e suas divisões e guerras, coisa que ainda não aconteceu. Com respeito a Paulo, a frase citada mostra que "no que depender" dos cristãos devem ser pacíficos para com todos. Mas ser pacífico não significa ser pacifista! Jesus era uma pessoa pacífica, mas não pacifista. Lembram-se da atitude que ele teve quando entrou no templo e viu a Casa do Seu Pai transformada em casa de comércio? "No pátio do templo viu alguns vendendo bois, ovelhas e pombas, e outros assentados diante de mesas, trocando dinheiro. Então ele fez um chicote de cordas e expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas e virou as suas mesas. Aos que vendiam pombas disse: "Tirem estas coisas daqui! Parem de fazer da casa de meu Pai um mercado!" Seus discípulos lembraram-se que está escrito: "O zelo pela tua casa me consumirá". – João 2:14-17 Se Jesus fosse um pacifista jamais teria tido este tipo de comportamento. E é claro que Jesus, como Rei dos Reis e Senhor dos Senhores, é descrito na Bíblia como um príncipe guerreiro que travará uma batalha contra as forças do mal. Longe da imagem pacifista que alguns cristãos têm dele! Mais uma vez, o usar ou não uma arma depende das circunstâncias! Qualquer perito em defesa pessoal lhe informará disso mesmo. Como disse o sábio rei Salomão em Eclesiastes 3: "Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu: […] Tempo para matar e tempo para curar; […] tempo de amar e tempo de odiar, tempo de lutar e tempo de viver em paz." – NVI Sendo assim, existe um tempo certo para lutar ou mesmo matar e um tempo para a paz. Depende das circunstâncias. Como é óbvio, um cristão só deverá usar de força letal como última medida e em caso de ver a sua vida em perigo. São as circunstâncias que determinarão o desfecho da situação. O argumento final de que as Testemunhas de Jeová devem esperar que os criminosos não as molestem apenas porque as identificam como tal é surreal! As notícias mostram como Testemunhas de Jeová têm sido mortas em assaltos por criminosos, que pouco se importam com a religião das vítimas! Vejamos alguns exemplos: – "Abu Sayyaf degola dois reféns nas Filipinas" – "Homem confessa ter cometido latrocínio de testemunha de Jeová" – "Três bandidos armados invadem Salão do Reino e assaltam fiéis durante a reunião" – "Japonesas atacadas na Guatemala: 1 morte e uma ferida" Só estes exemplos mostram claramente como alguém ser uma Testemunha de Jeová não as protege automaticamente de serem assaltadas e até mesmo mortas por criminosos. É claro que ter uma arma em casa não é garantia de que isso não possa acontecer, mas poderia ser um forte dissuasor na eventualidade de um assalto e até mesmo poder salvar a vida das vítimas? Claro que sim! Veja este exemplo: O argumento do autor do texto centra-se nos bens materiais, como se isso fosse o foco principal de alguém ter uma arma para defesa pessoal. Isso é apenas um lado da questão. As pessoas que têm armas é acima de tudo para preservar suas vidas em caso de assaltos violentos, tentativas de rapto ou mesmo ameaça de morte. Aqui entra o velho argumento de "não fazer outros tropeçar". É, na realidade, uma forma de pressão de grupo. As Testemunhas de Jeová só "tropeçam" caso saibam que uma delas tem uma arma porque a Torre de Vigia coloca isso numa luz negativa. Se a Organização deixasse isso ao critério de cada um e simplesmente mostrasse TUDO o que a Bíblia diz sobre o assunto e no respetivo contexto, ninguém teria razões para tropeçar. Se alguém cria razões fictícias para tropeço são os líderes religiosos desta seita que tudo fazem para controlar seus membros, criando regras "como mandados de homens". Quando lhes interessa, usam a Lei Mosaica para condenar certas coisas e mostrar que outras podem ser feitas. Mas quando não lhes interessa "esquecem-se" dela e usam subterfúgios doutrinais para impedir o livre exercício da defesa pessoal (entre outras coisas). Imagine a situação hipotética de um casal Testemunha de Jeová, morando numa vivenda isolada. O casal já havia ponderado adquirir uma arma para defesa pessoal e como último recurso, em caso de virem a sofrer algum assalto violento. Afinal, tendo crianças e vivendo numa região onde é comum existirem assaltos a residências, o casal considerou a passagem em que Paulo diz: "Mas, se alguém não cuida dos seus, e especialmente dos da sua família, tem negado a fé, e é pior que um incrédulo." – 1 Timóteo 5:8 (Versão Almeida Revista e Atualizada) Cuidar da família implica não apenas prover o sustento material e uma casa onde habitar, mas também protegê-la de eventuais perigos. Isso pode abranger o aspeto da segurança! Assim como alguém instala alarmes em sua casa para detectar e alertar para eventuais invasores, do mesmo modo as pessoas podem querer ter uma arma de fogo para usar como último recurso, servindo como dissuasor e protetor de suas vidas. Raciocinando deste modo, este casal refletiu no assunto e achou que sua consciência lhes permitia adquirir uma arma de fogo. Mas o que acontece entretanto? O medo de que outros membros da congregação possam vir a saber e o medo de virem a ter problemas com os anciãos, leva-os a pôr isso de parte. Afinal, não querem fazer "tropeçar" seus irmãos na fé. Certo dia, enquanto o casal e seus filhos dormem no andar de cima, assaltantes quebram o vidro da porta da cozinha e entram na casa. Estes invasores já haviam realizado outros assaltos violentos, onde até mesmo chegaram a violar mulheres à vista de seus maridos amarrados e espancados. Podemos imaginar o desfecho desta história… De quem seria a culpa deste casal não ter adquirido uma arma para sua protecção? Não seria dos líderes religiosos, que até mesmo contra aquilo que a Bíblia claramente diz sobre protecção pessoal, transmitem a ideia de que Deus condena o uso de armas para defesa da integridade física? Pois é! O problema é que tais líderes, que dormem em lugares paradisíacos e com segurança privada 24 horas por dia, jamais ficarão com as culpas. Continuarão a dormir em seus palácios protegidos de todo o mal e sem medo de que algum invasor lhes entre pela casa adentro. Como se não bastasse apelar para a questão de alguém servir de "pedra tropeço", este parágrafo parte para algo mais concreto e ameaçador. Aqui a tónica é: "Ou fazes o que nós queremos ou então terás sérios problemas!" Até agora, como vimos, a organização não apresentou qualquer base bíblica com sustentação para invalidar o porte de arma. Usou passagens descontextualizadas e algumas sem qualquer ligação ao assunto. Como se isso não bastasse, caso alguém ouse ir contra uma opinião meramente humana e inválida à luz da Bíblia como um todo ameaçasse a pessoa com represálias. Até mesmo uma TJ que use porte de arma devido ao seu trabalho será vista com maus olhos na congregação e até mesmo sendo incentivada a mudar de emprego. O mais curioso é que na Bíblia existem vários exemplos de homens que receberam as Boas Novas enquanto soldados e jamais lhes foi dito que deveriam abandonar suas profissões e desfazerem-se de suas armas. A organização vai além do que está escrito e tenta controlar a vida das pessoas em todas as facetas da sua vida. Não! "O modo como um cristão decide proteger a si mesmo, sua família e seus bens materiais" não é um assunto pessoal. Não se você for membro do grupo religioso Testemunhas de Jeová. Neste caso, a sua vida será totalmente decidida e controlada por homens poderosos que vivem protegidos atrás dos muros de uma organização bilionária, onde os recursos materiais e humanos ultrapassam muitas das organizações comerciais "mundanas". Os "princípios" apresentados neste artigo são muito fracos, até mesmo ao nível de uma criança. Um artigo cheio de falácias, textos descontextualizados e escolhidos a dedo para conduzir o leitor a uma conclusão que de bíblica pouco tem. Confiar em Deus e obedecer a Ele não implica que alguém não se proteja. Por isso vivemos dentro de casas com o mínimo de segurança: fechaduras, trancas e grades. Essas são as primeiras barreiras a uma possível invasão que poderá resultar em crime violento. Os líderes das Testemunhas de Jeová demonstram desonestidade intelectual ao tentarem forçar um argumento, impondo aos membros algo que apenas cabe a cada um decidir. Incutir medos e fobias é uma das armas principais das seitas destrutivas. Este artigo é mais uma prova disso mesmo. António Madaleno
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